sábado, 9 de março de 2013

ENTREVISTA - JOELINA A FILHA DE MARIA


Joelina Barros de Araújo a Filha de Maria

Em visita ao museu da catedral Sagrado Coração de Jesus em Porto Velho, que também é conhecido como Museu Dom João Batista Costa, encontramos a dona Joelina, pessoa que conhecemos há bastante tempo, mas, que não sabíamos o quanto é conhecedora da história da nossa igreja catedral. “Quando cheguei com minha mãe em Porto Velho em 1951 o primeiro local que meu irmão me levou pra conhecer foi a catedral”. Nesse dia ela viu o padre Ângelo Cerri pintando a cúpula da igreja com as “Oito Aventuranças” e se apaixonou pelo templo, ao ponto de passar a frequenta-lo praticamente todos os dias, até que o vigário Pe. João Seu a convidou para ser “Filha de Maria”, depois passou a ser catequista até que foi contratada como funcionária da paróquia. Pessoa super bem informada, não apenas sobre a história da catedral. Joelina lembra com detalhes do tempo que ainda criança, veio para as terras que hoje formam o estado de Rondônia, acompanhando sua mãe e irmãos no árduo trabalho dos seringais de Jacy Paraná e do rio Machadinho. “Seringueiro não come peixe porque não tem tempo de pescar”. Entre tantos sacerdotes, conviveu e conhece as histórias do bispo Dom João Batista Costa e do padre Francisco Pucci o padre Chiquinho. “São dois santos”.
Através da dona Joelina Barros de Araújo prestamos homenagem a todas as mulheres pelo dia Internacional da Mulher!

ENTREVISTA

Zk – A senhora pode nos falar onde nasceu e quando?
Joelina – Nasci no município de Altaz Mirim no Amazonas no dia 4 de dezembro de 1934.
Zk – E quando foi que veio para Rondônia?
Joelina – A gente morava no interior do Amazonas, meu pai era agricultor, depois a gente mudou pra cidade de Manaus, aí foi o tempo que meu pai faleceu e então ficou minha mãe comigo pequena e dois irmãos adolescentes que trabalhavam naquelas usinas que existam por lá. Quando chegou o período da segunda grande guerra mundial em 1942 e eles foram convocados pra servir o Exército, só que eram menores de idade e também foram dispensados porque eram arrimo de família.
Zk – Escaparam de ir guerrear na Itália e foram fazer o que?
Joelina – Com medo de serem convocado novamente, procuraram um seringal pra trabalhar e assim ficar longe da vista das autoridades.
Zk – Foram para qual seringal?
Joelina – Tinha aqui a empresa Jacy Paraná Ltda. que pertencia àquela firma do Isaque Sabbá e Cia e mesmo eles sendo menores de idade o gerente geral da empresa seu Antônio Fernandes Barroso tirou licença no juizado e trouxe-os para o seringal. Seis meses depois que eles estavam aqui eu vim com a mamãe.

Zk – A senhora lembra o nome do navio no qual fez a viagem Manaus/Porto Velho?
Joelina – Foi no navio Jamari que chegou aqui em Porto Velho no dia 16 de julho de 1942 e fomos nos hospedar no hotel do seu Teófilo que ficava na rua Duque de Caxias (Hotel Vitória) onde ficamos durante uns oito dias, até chegar a ordem pra gente ir de trem até Jacy Paraná. Em Jacy a gente embarcou num barco a motor para o 1º Barracão do Seringal cujo nome era São Domingo.
Zk – Vocês ficaram morando e trabalhando em São Domingo?
Joelina – Não, o seringal onde meus irmãos trabalhavam se chamava União. De Jacy pro primeiro Barracão eram três dias de viagem de subida. Do primeiro barracão para o seringal União eram nove horas de viagem no lombo de burro e dois dias de viagem de barco. Como o rio tava muito seco, era um Batelão bem grande movimentado a “Varejão”.

Zk – Qual o trabalho da senhora com sua mãe no seringal. Quantos anos a senhora tinha quando chegou ao seringal União?
Joelina – Minha mãe fazia o trabalho de dona de casa, não fomos cortar seringa, essa serviço era dos meus irmãos. Era cuidar da casa, lavar roupa, varrer terreiro, fazer comida, criar galinha e outros animais e eu com meus oito aninhos de idade junto com ela servindo de companhia.
Zk – A senhora falou que com o tempo voltaram pro Amazonas e depois vieram de novo trabalhar nos seringais de Rondônia. Como aconteceu isso?
Joelina – Pois é! Entramos pra lá em 1942 baixamos em 1944 porque meus irmãos tiraram um bom saldo. Nove Contos de Réis. Chegando aqui pra nossa sorte estava atracada no Porto a Chata Cuiabá e depois que ela descarregou nós embarcamos para Manaus cheio do dinheiro.

Zk – Em Manaus foram fazer o que?
Joelina – Gastar o saldo, rever os amigos e parentes. Acontece que meus irmãos não se adaptaram à vida da cidade grande, porque estavam acostumados com a vida pacata do seringal e então resolveram voltar a trabalhar como seringueiro.

Zk – Dessa vez foram para qual seringal?
Joelina – Dessa vez eles vieram trabalhar no seringal do Rocha e Costa no Rio Machadinho. A viagem para o Machadinho começa em Calama onde o rio Machado desagua e lá em Tabajara fica a divisa dos dois rios, Machado e Machadinho. Quando chegamos em 2 de Novembro desembarcamos e cruzamos pra Angustura que era o 1º Barracão dos seringais do Rocha e Costa. Essa viagem foi feita em lombo de burro. Fomos pra Jatuarana e depois pra Boa Vista onde ficamos morando. Ficamos no seringal do Rocha e Costa de 1944 até 1951.
Zk – É verdade que nas festas dos seringais por falta de mulher, homem dançava com homem?
Joelina – Olha isso eu não sei! Quando eu fui para o seringal era comum na festa, cada um dançar com seu par, ou seja, homem e mulher. Esse negócio de homem com homem pode ter sido antigamente nos seringais do Acre em mil novecentos e lá vai. No meu tempo, o seringal já não era um local tão desinformado, era mais social.

Zk – Pelo que notei, no caso dos seus irmãos não aconteceu de eles saírem do seringal devendo como era costume. A senhora pode nos dizer em qual situação o seringueiro não tirava saldo?
Joelina – Tinha duas situações: Uma era por doença impaludismo, hidropisia, beribéri. A outra que considero a principal, era se ele fosse preguiçoso. Ao não produzir e comprando as mercadorias que eram muito caras a conta só fazia aumentar.

Zk – O que se comia no seringal naquela época?
Joelina – Alguma vez o Rocha levava fardo de charque e conserva, mas aquilo era muito pouco, vamos dizer, era uma sobremesa. A gente comia mesmo era carne de caça. O principal ingrediente no preparo da carne de caça era e é o Leite da Castanha e em segundo lugar o Leite do Coco. Tem um detalhe, seringueiro não costumava comer peixe, porque não tinha tempo de pescar. Já a caça ele encontrava nas estradas de seringa.

Zk – Agora vamos falar sobre a religiosa?
Joelina – Em 1951 viemos morar em Porto Velho. O primeiro lugar que meu irmão me levou pra conhecer em Porto Velho foi a igreja catedral. O padre Ângelo Cerri estava fazendo a pintura da cúpula, as “Oito Bem Aventuranças” e por isso o altar estava encostado na porta principal que da pra D. Pedro II, a gente só entrava pelas portas laterais.

Zk – E como colaboradora paroquial começou quando?
Joelina – Pra trabalhar mesmo dentro da igreja já foi em 1963, quando o padre João Seu era vigário e me convidou para ser Filha de Maria – uma associação só de moças e eu aceitei. Depois ele me convidou pra ser catequista e então fui estudar para me preparar para trabalhar na catequese, com isso passei a passar o maior tempo na igreja porque meu trabalho pastoral exigia e exige isso.
Zk – Como foi que a senhora conheceu D, João Batista Costa?
Joelina – Em virtude do meu envolvimento com a igreja conheci D. João, ele era aquele bispo caridoso. Nossa era muito humilde, minha mãe lavava roupa pra fora e eu ajudava, meu irmão com muito esforço se profissionalizou como pintor e carpinteiro e então com a vivencia dentro da igreja conhecemos D. João aquela figura importante. Não tinha um fiel que chegasse e ele não prestasse atenção. Eu me crismei com ele e depois como catequista passei a ter mais contato com ele. Depois de tudo isso me empreguei na catedral.

Zk – Passou a ser funcionária da paróquia?
Joelina – Isso aconteceu em 1991 quando fui contratada como funcionária da igreja. Trabalhei na secretaria durante 15 anos e depois o padre Emilio me transferiu para o Museu.
Zk – Fale mais sobre o Museu da Catedral?
Joelina – Na realidade esse Museu foi criado pelo padre Emilio para preservar a memória do bispo D. João Batista Costa. O museu fica ao lado da catedral metropolitana de Porto Velho Sagrado Coração de Jesus. No Museu você encontra alguns objetos pessoais de D. João, parte da história de Porto Velho. Tem até a primeira mesa de som da Rádio Caiari. Por eu ter conhecimento da nossa igreja catedral ele me nomeou como gerente do Museu.
Zk – A senhora conheceu o padre Chiquinho. É verdade que ele faz milagre?
Joelina – Padre Chiquinho era um religioso muito fiel e dedicado à missão que Deus lhe deu.  Pra mim e para muitas pessoas o padre Chiquinho é Santo ele e D. João. Temos relatos de muitas pessoas que foram curadas invocando ou o padre Chiquinho ou D. João. Tá faltando um corajoso pra dar inicia ao processo de canonização desses dois Santos. No coração do povo eles já são Santo.

Zk - A senhora sabe de alguém que já recebeu graça invocando um dos dois?
Joelina – Muitos desses veteranos que frequentam a igreja, já receberam graça. Você nota que depois da missa no dia de domingo, a pessoa comunga e vai se ajoelhar em frente ao túmulo do D. João, isso acontece durante todos os dias da semana, o túmulo é um dos lugares da igreja mais visitado.

Zk – É verdade que antigamente os grandes arraias da cidade aconteciam na catedral?
Joelina – Era muito bom, no mês de maio era o mês todo de arraial em homenagem a Nossa Senhora. A paróquia vendia espaço para montagem de barracas de vendas de guloseimas, e tinha barraca da igreja que toda noite tinha uma família como patrocinadora. Essa família doava além de pratos típicos como pato no tucupi, bolo de macaxeira leitão assado, galinha que eram leiloados. E tinha muita banca de jogo e até carrossel pras crianças.

Zk – E no mês de outubro?
Joelina – Era o arraial em homenagem a Nossa Senhora de Nazaré. Tinha uma brincadeira que era a mais disputada pelos jovens, consistia em as moças prender os rapazes numa cadeia improvisada e os rapazes tinham que pagar para sair. As mais bonitas eram as que prendiam mais rapazes. Eram uma algazarra aquelas brincadeiras.

Zk – Para encerrar. A senhora lembra o nome dos vigários que comandaram a catedral nesses anos todos?
Joelina – Lembro-me do Padre Humberto Felipelli que passou 12 anos, depois veio o Pe. João Seu que foi vigário duas vezes e Pe. João Carlos Isoardi. Teve um período que dentro de três a quatro anos, mudou várias vezes. Então depois do João Carlos veio o Pe. João Moreti, Pe. Patrício, Pe. José Delavare, Pe. Moisés e do Moisés o Pe. Zenildo. Foi então que assumiu o Pe. Emilio Lanoce que ficou por mais de 20 anos comandando a catedral.
Zk – A senhora foi escolhida pela nossa editoria como a Mulher destaque na semana da mulher deste ano de 2013. Qual a mensagem que a senhora deixa para as demais mulheres?
Joelina – É que elas sejam sempre felizes porque são mulheres; nunca se deixe abater por pensamentos negativos; sejam sempre mulheres de caráter e de visibilidade, só assim, nós seremos sempre bem queridas e estimadas por toda a humanidade! A mulher tem um grande privilégio, é ser a geradora da humanidade e isso já a torna uma pessoa especial.

Um comentário:

Agda Alencar disse...

Gostaria de saber quem realizou essa entrevista, onde realizou e se poderia me passar seu email.