Joelina
Barros de Araújo a Filha de Maria
Em visita ao museu da
catedral Sagrado Coração de Jesus em Porto Velho, que também é conhecido como
Museu Dom João Batista Costa, encontramos a dona Joelina, pessoa que conhecemos
há bastante tempo, mas, que não sabíamos o quanto é conhecedora da história da
nossa igreja catedral. “Quando cheguei com minha mãe em Porto Velho
em 1951 o primeiro local que meu irmão me levou pra conhecer foi a catedral”. Nesse
dia ela viu o padre Ângelo Cerri pintando a cúpula da igreja com as “Oito Aventuranças”
e se apaixonou pelo templo, ao ponto de passar a frequenta-lo praticamente todos
os dias, até que o vigário Pe. João Seu a convidou para ser “Filha de Maria”,
depois passou a ser catequista até que foi contratada como funcionária da
paróquia. Pessoa super bem informada, não apenas sobre a história da catedral.
Joelina lembra com detalhes do tempo que ainda criança, veio para as terras que
hoje formam o estado de Rondônia, acompanhando sua mãe e irmãos no árduo
trabalho dos seringais de Jacy Paraná e do rio Machadinho. “Seringueiro não come peixe
porque não tem tempo de pescar”. Entre tantos sacerdotes, conviveu e
conhece as histórias do bispo Dom João Batista Costa e do padre Francisco Pucci
o padre Chiquinho. “São dois santos”.
Através da dona Joelina Barros de Araújo prestamos
homenagem a todas as mulheres pelo dia Internacional da Mulher!
ENTREVISTA
Zk – A senhora pode nos
falar onde nasceu e quando?
Joelina – Nasci no município
de Altaz Mirim no Amazonas no dia 4 de dezembro de 1934.
Zk – E quando foi que veio
para Rondônia?
Joelina – A gente morava no
interior do Amazonas, meu pai era agricultor, depois a gente mudou pra cidade
de Manaus, aí foi o tempo que meu pai faleceu e então ficou minha mãe comigo
pequena e dois irmãos adolescentes que trabalhavam naquelas usinas que existam
por lá. Quando chegou o período da segunda grande guerra mundial em 1942 e eles
foram convocados pra servir o Exército, só que eram menores de idade e também
foram dispensados porque eram arrimo de família.
Zk – Escaparam de ir
guerrear na Itália e foram fazer o que?
Joelina – Com medo de serem
convocado novamente, procuraram um seringal pra trabalhar e assim ficar longe
da vista das autoridades.
Zk – Foram para qual
seringal?
Joelina – Tinha aqui a
empresa Jacy Paraná Ltda. que pertencia àquela firma do Isaque Sabbá e Cia e
mesmo eles sendo menores de idade o gerente geral da empresa seu Antônio
Fernandes Barroso tirou licença no juizado e trouxe-os para o seringal. Seis
meses depois que eles estavam aqui eu vim com a mamãe.
Zk – A senhora lembra o nome
do navio no qual fez a viagem Manaus/Porto Velho?
Joelina – Foi no navio
Jamari que chegou aqui em Porto Velho no dia 16 de julho de 1942 e fomos nos
hospedar no hotel do seu Teófilo que ficava na rua Duque de Caxias (Hotel
Vitória) onde ficamos durante uns oito dias, até chegar a ordem pra gente ir de
trem até Jacy Paraná. Em Jacy a gente embarcou num barco a motor para o 1º
Barracão do Seringal cujo nome era São Domingo.
Zk – Vocês ficaram morando e
trabalhando em São Domingo?
Joelina – Não, o seringal
onde meus irmãos trabalhavam se chamava União. De Jacy pro primeiro Barracão
eram três dias de viagem de subida. Do primeiro barracão para o seringal União
eram nove horas de viagem no lombo de burro e dois dias de viagem de barco.
Como o rio tava muito seco, era um Batelão bem grande movimentado a “Varejão”.
Zk – Qual o trabalho da
senhora com sua mãe no seringal. Quantos anos a senhora tinha quando chegou ao
seringal União?
Joelina – Minha mãe fazia o
trabalho de dona de casa, não fomos cortar seringa, essa serviço era dos meus
irmãos. Era cuidar da casa, lavar roupa, varrer terreiro, fazer comida, criar
galinha e outros animais e eu com meus oito aninhos de idade junto com ela
servindo de companhia.
Zk – A senhora falou que com
o tempo voltaram pro Amazonas e depois vieram de novo trabalhar nos seringais
de Rondônia. Como aconteceu isso?
Joelina – Pois é! Entramos
pra lá em 1942 baixamos em 1944 porque meus irmãos tiraram um bom saldo. Nove
Contos de Réis. Chegando aqui pra nossa sorte estava atracada no Porto a Chata
Cuiabá e depois que ela descarregou nós embarcamos para Manaus cheio do
dinheiro.
Zk – Em Manaus foram fazer o
que?
Joelina – Gastar o saldo,
rever os amigos e parentes. Acontece que meus irmãos não se adaptaram à vida da
cidade grande, porque estavam acostumados com a vida pacata do seringal e então
resolveram voltar a trabalhar como seringueiro.
Zk – Dessa vez foram para
qual seringal?
Joelina – Dessa vez eles
vieram trabalhar no seringal do Rocha e Costa no Rio Machadinho. A viagem para
o Machadinho começa em Calama onde o rio Machado desagua e lá em Tabajara fica
a divisa dos dois rios, Machado e Machadinho. Quando chegamos em 2 de Novembro
desembarcamos e cruzamos pra Angustura que era o 1º Barracão dos seringais do
Rocha e Costa. Essa viagem foi feita em lombo de burro. Fomos pra Jatuarana e
depois pra Boa Vista onde ficamos morando. Ficamos no seringal do Rocha e Costa
de 1944 até 1951.
Zk – É verdade que nas
festas dos seringais por falta de mulher, homem dançava com homem?
Joelina – Olha isso eu não
sei! Quando eu fui para o seringal era comum na festa, cada um dançar com seu
par, ou seja, homem e mulher. Esse negócio de homem com homem pode ter sido
antigamente nos seringais do Acre em mil novecentos e lá vai. No meu tempo, o
seringal já não era um local tão desinformado, era mais social.
Zk – Pelo que notei, no caso
dos seus irmãos não aconteceu de eles saírem do seringal devendo como era
costume. A senhora pode nos dizer em qual situação o seringueiro não tirava
saldo?
Joelina – Tinha duas
situações: Uma era por doença impaludismo, hidropisia, beribéri. A outra que
considero a principal, era se ele fosse preguiçoso. Ao não produzir e comprando
as mercadorias que eram muito caras a conta só fazia aumentar.
Zk – O que se comia no
seringal naquela época?
Joelina – Alguma vez o Rocha
levava fardo de charque e conserva, mas aquilo era muito pouco, vamos dizer,
era uma sobremesa. A gente comia mesmo era carne de caça. O principal
ingrediente no preparo da carne de caça era e é o Leite da Castanha e em
segundo lugar o Leite do Coco. Tem um detalhe, seringueiro não costumava comer
peixe, porque não tinha tempo de pescar. Já a caça ele encontrava nas estradas
de seringa.
Zk – Agora vamos falar sobre
a religiosa?
Joelina – Em 1951 viemos
morar em Porto Velho. O primeiro lugar que meu irmão me levou pra conhecer em
Porto Velho foi a igreja catedral. O padre Ângelo Cerri estava fazendo a
pintura da cúpula, as “Oito Bem Aventuranças” e por isso o altar estava
encostado na porta principal que da pra D. Pedro II, a gente só entrava pelas
portas laterais.
Zk – E como colaboradora
paroquial começou quando?
Joelina – Pra trabalhar
mesmo dentro da igreja já foi em 1963, quando o padre João Seu era vigário e me
convidou para ser Filha de Maria – uma associação só de moças e eu aceitei.
Depois ele me convidou pra ser catequista e então fui estudar para me preparar
para trabalhar na catequese, com isso passei a passar o maior tempo na igreja
porque meu trabalho pastoral exigia e exige isso.
Zk – Como foi que a senhora
conheceu D, João Batista Costa?
Joelina – Em virtude do meu
envolvimento com a igreja conheci D. João, ele era aquele bispo caridoso. Nossa
era muito humilde, minha mãe lavava roupa pra fora e eu ajudava, meu irmão com
muito esforço se profissionalizou como pintor e carpinteiro e então com a
vivencia dentro da igreja conhecemos D. João aquela figura importante. Não
tinha um fiel que chegasse e ele não prestasse atenção. Eu me crismei com ele e
depois como catequista passei a ter mais contato com ele. Depois de tudo isso
me empreguei na catedral.
Zk – Passou a ser
funcionária da paróquia?
Joelina – Isso aconteceu em
1991 quando fui contratada como funcionária da igreja. Trabalhei na secretaria
durante 15 anos e depois o padre Emilio me transferiu para o Museu.
Zk – Fale mais sobre o Museu
da Catedral?
Joelina – Na realidade esse
Museu foi criado pelo padre Emilio para preservar a memória do bispo D. João
Batista Costa. O museu fica ao lado da catedral metropolitana de Porto Velho
Sagrado Coração de Jesus. No Museu você encontra alguns objetos pessoais de D.
João, parte da história de Porto Velho. Tem até a primeira mesa de som da Rádio
Caiari. Por eu ter conhecimento da nossa igreja catedral ele me nomeou como
gerente do Museu.
Zk – A senhora conheceu o
padre Chiquinho. É verdade que ele faz milagre?
Joelina – Padre Chiquinho
era um religioso muito fiel e dedicado à missão que Deus lhe deu. Pra mim e para muitas pessoas o padre
Chiquinho é Santo ele e D. João. Temos relatos de muitas pessoas que foram
curadas invocando ou o padre Chiquinho ou D. João. Tá faltando um corajoso pra
dar inicia ao processo de canonização desses dois Santos. No coração do povo
eles já são Santo.
Zk - A senhora sabe de
alguém que já recebeu graça invocando um dos dois?
Joelina – Muitos desses
veteranos que frequentam a igreja, já receberam graça. Você nota que depois da
missa no dia de domingo, a pessoa comunga e vai se ajoelhar em frente ao túmulo
do D. João, isso acontece durante todos os dias da semana, o túmulo é um dos
lugares da igreja mais visitado.
Zk – É verdade que
antigamente os grandes arraias da cidade aconteciam na catedral?
Joelina – Era muito bom, no mês
de maio era o mês todo de arraial em homenagem a Nossa Senhora. A paróquia
vendia espaço para montagem de barracas de vendas de guloseimas, e tinha
barraca da igreja que toda noite tinha uma família como patrocinadora. Essa
família doava além de pratos típicos como pato no tucupi, bolo de macaxeira
leitão assado, galinha que eram leiloados. E tinha muita banca de jogo e até
carrossel pras crianças.
Zk – E no mês de outubro?
Joelina – Era o arraial em
homenagem a Nossa Senhora de Nazaré. Tinha uma brincadeira que era a mais
disputada pelos jovens, consistia em as moças prender os rapazes numa cadeia
improvisada e os rapazes tinham que pagar para sair. As mais bonitas eram as
que prendiam mais rapazes. Eram uma algazarra aquelas brincadeiras.
Zk – Para encerrar. A
senhora lembra o nome dos vigários que comandaram a catedral nesses anos todos?
Joelina – Lembro-me do Padre
Humberto Felipelli que passou 12 anos, depois veio o Pe. João Seu que foi
vigário duas vezes e Pe. João Carlos Isoardi. Teve um período que dentro de
três a quatro anos, mudou várias vezes. Então depois do João Carlos veio o Pe.
João Moreti, Pe. Patrício, Pe. José Delavare, Pe. Moisés e do Moisés o Pe.
Zenildo. Foi então que assumiu o Pe. Emilio Lanoce que ficou por mais de 20
anos comandando a catedral.
Zk – A senhora foi escolhida
pela nossa editoria como a Mulher destaque na semana da mulher deste ano de
2013. Qual a mensagem que a senhora deixa para as demais mulheres?
Joelina – É que elas sejam
sempre felizes porque são mulheres; nunca se deixe abater por pensamentos
negativos; sejam sempre mulheres de caráter e de visibilidade, só assim, nós
seremos sempre bem queridas e estimadas por toda a humanidade! A mulher tem um
grande privilégio, é ser a geradora da humanidade e isso já a torna uma pessoa
especial.
Um comentário:
Gostaria de saber quem realizou essa entrevista, onde realizou e se poderia me passar seu email.
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