“O Manelão era todo esquisito, mas como ele colaborava com nosso boi resolvemos homenageá-lo quando ele fez 25 anos morando em Porto Velho”
F O L C L O R E
Beija Flor do Norte e Mimosinho os amores do Batista
Uma coisa que ninguém se preocupou em registrar em livros até os dias de hoje, é a história dos pioneiros do Arraial Flor do Maracujá, não estou me referindo aos seus idealizadores, mas, aqueles que garantiram o sucesso da festa em seus primeiros anos, como é o caso do folclorista João Batista Gomes da Silva, que foi o idealizador dos grupos Quadrilha Beija Flor do Norte e Boi Mirim Mimosinho. Hoje apesar de ter sofrido um derrame cerebral e viver a maior parte do dia em uma cadeira de rodas, já que teve uma perna amputada, Batista como é conhecido por todos, se preocupa com a cultura popular e em especial com a brincadeira de Boi Bumbá e a dança de Quadrilha. Respeitadíssimo pelos dirigentes de grupos folclóricos, pois a Quadrilha Beija Flor do Norte assim como Boi Mirim Mimosinho até quando existiram, jamais deixaram de ganhar o troféu de campeão do Flor do Maracujá!
Batista se orgulha de ser cunhado do famoso artista plástico Afonso Ligório e irmão de um dos maiores e melhores levantadores de Toada de Rondônia o cantor Carlos Mariano.
Domingo passado dia 20, fomos até a residência do Batista no bairro Nova Floresta e gravamos as histórias que segue:
E N T R E V I S T A
Zk – Vamos falar sobre você?
Batista – Meu nome é João Batista Gomes da Silva nasci em Porto Velho em 1953 no bairro do Areal. Já com 12 anos o Nonato Guedes fundador do Boi Bumbá Az de Ouro, começou a me levar pros ensaios do Boi Malhadinho. Era eu o Mariano meu irmão e o Bicudo a gente só saia pro Boi se fosse com o Nonato. Meu pai era o seu José Gomes da Silva mais conhecido como Pernambuco e minha mãe dona Alice Duarte irmã do famoso artista plástico Afonso Ligório. Lembro que o curral do Malhadinho era na rua Joaquim Nabuco com a Princesa Isabel no bairro Tucumanzal.
Zk – Você brincava de que?
Batista – Era da Barreira de Vaqueiro, aliás, o melhor Vaqueiro do Boi. Na época a gente cantava uma toada que o Flávio Carneiro (falecido) gostava muito: “... Marrequinha da lagoa, quem te ensinou a nadar, foi foi, foi, foi os peixinhos do mar...”.
Zk – Conta a história do surgimento do famoso Boi Mirim Mimosinho?
Batista – Pois é colega, o Mimosinho deixou muita saudade. Pessoas como você, Aluízio Guedes, Beni Andrade da rádio Caiari e o Dalton Di Franco que era da rádio Eldorado me ajudaram muito, principalmente a professora Yedda Bozarcov. Acontece que eu tinha uma quadrilha e a professora Yedda chegou e disse: “Batista larga esse negócio de quadrilha e põe um Boi”.
Zk – Qual era a Quadrilha?
Batista – Era a Beija Flor do Norte. Eu era o organizador e o marcador da Quadrilha que surgiu no bairro Nova Floresta no pátio da igreja São José Operário. Naquele tempo não tinha iluminação (energia elétrica) no bairro. Para iluminar o curral de dança aonde a gente ensaiava era assim: Eu trabalhava no 5º BEC e lá existia muito óleo queimado, trazia baldes daquele óleo e a noite a gente ensopava várias estopas e transformava em tocha que eram colocadas em locais estratégicos do curral e ali a gente ensaiava e dançava. Seu Luiz Moraes tinha um motorzinho de luz e de vez em quando iluminava o curral pra gente se apresentar. A igreja de madeira foi construída pelo padre Mário Castgña, depois veio o padre André que falou até no sermão da missa: “Essa quadrilha do Batista além de ser muito boa, tá nos ajudando muito, todo dia de manhã vejo sapé (capim) todo amassado de tanto pisarem”. Fomos sete (7) vezes campeão do Flor do Maracujá, tinha a quadrilha adulta e a mirim. Depois parei com a adulta e fiquei só com a mirim foi quando a professora Yedda sugeriu que eu colocasse um Boi Mirim e então criei o Mimosinho que também foi sucesso e até enquanto eu o dirigi foi campeão no Flor do Maracujá. Nosso amo era o Coquinho.
Zk – Cadê o Coquinho?
Batista – Tá homem formado. Ele gostava muito de cantar as tuas toadas. Certa vez durante apresentação no Flor do Maracujá ele anunciou: Silvio Santos essa toada é em sua homenagem e cantou: “Vem ver ô morena bonita, com seu laço de fita, no Flor do Maracujá...” toada que você fez pro Az de Ouro. Ele também gostava de cantar aquela que diz: “Vou chamar, vou chamar meus batuqueiros, barreiras, rapazes e vaqueiros...”, que você fez pro Boi Tira Prosa.
Zk – Quem era o compositor oficial do Boi Mimosinho?
Batista – Era o saudoso Baba, ele fez muita toada bonita pro nosso Boi, por exemplo: “Povo de Rondônia boa noite, Mimosinho acabou de chegar, vem de longe muito longe... O contrário se prepare que o show vai começar...”.
Zk – O Mimosinho também homenageou o Manelão da Banda do Vai Quem Quer?
Batista – O Manelão era todo esquisito, não aceitava que a gente fizesse homenagem a ele. Acontece que era um grande colaborador do nosso Boi e então resolvemos homenageá-lo quando ele fez 25 anos morando em Porto Velho. Lembro que você se encarregou de levá-lo para nossa apresentação no Flor do Maracujá. O certo foi que na hora que o Roque anunciou a entrada do Boi Mimosinho no Curral de Dança do Maracujá você entrou com o Manelão e o delegado Walderedo Paiva aquilo me emocionou muito e as crianças do Boi ficaram todas eufóricas porque o “seu Manelão” tava junto com eles. Pedi para o Aluízio Guedes que na época tinha um programa na rádio Caiari fazer o discurso de agradecimento ao Manelão, foi muito emocionante aquele momento. O Coquinho cantou: “Ensaiei boi em maio pra dançar em São João e saudar o dono da Banda que é o Mestre Manelão”. O interessante foi que quando acabou a apresentação, ele chegou comigo e falou: ”Batista essa toada tem o dedo do Silvio não tem?” e eu, Como é que o senhor sabe! O resto da toada dizia: “Ele também é pioneiro do estado de Rondônia, com seus 25 anos de trabalho e dedicação, por isso, nessa festa de São João, Mimosinho vem saudar, o grande Mestre Manelão...”.
Zk – Até quando você colocou o Boi Mimosinho no Flor do Maracujá?
Batista – Fiquei na direção do Mimosinho até meados da década de 1990, quando o Nego criou o Boi Veludinho. Até hoje o Nego agradece o apoio que dei a ele, ensinando inclusive ele a organizar o grupo essas coisas. Outra pessoa que homenageamos foi o seu Hiram Brito Mendes.
Zk – Como foi essa homenagem?
Batista – O Hiram foi um dos fundadores do Boi Bumbá Az de Ouro juntamente com o Nonato, e também ajudou muito o nosso Mimosinho, apesar de ser carnavalesco e até presidente da escola de samba Pobres do Caiari, gostava e gosta da brincadeira de Boi. Aí ele saiu candidato a vereador e eu o alertei: Seu Hiram esse povo de Boi Bumbá é falso. Para provar que nosso grupo é fiel, vamos lhe homenagear na nossa apresentação no Flor do Maracujá e ele ficou com medo: “Rapaz isso pode dar problema com a minha candidatura”. Fique tranquilo: O Nonato apresentou o Az de Ouro e nem falou o nome do Hiram, fiquei chateado, afinal de contas seu Hiram era um dos fundadores do Boi dele. Quando o Roque anunciou o Mimosinho eu entrei na arena e falei: Galera de Rondônia, aqui está o maior incentivador do carnaval e do boi bumbá em Porto Velho, seu Hiram Brito Mendes, a batucada rufou os tambores e a torcida na arquibancada vibrou! O Flávio Carneiro correu lá comigo: “Rapaz tu tá doido, fazendo política aqui no Maracujá”, Flávio se você quiser pode desclassificar o meu Boi, mas, o seu Hiram merece ser homenageado. Resultado, o Mimosinho foi mais uma vez campeão. Tem mais um detalhe, as cores do nosso Boi era Vermelha e Branca, mas, em homenagem ao Hiram presidente da escola de samba Pobres do Caiari entramos naquele dia de azul e branco.
Zk – Por que você parou de se envolver com grupos folclóricos:
Batista – Acontece que a idade vem chegando e no meu caso perdi a paciência. Veja bem você Silvio Santos, é respeitado em qualquer curral de Boi Bumbá, de Quadrilha e no Carnaval aqui de Porto Velho, mas, a gente ver que você também já está cansado de tanta incompreensão. Depois que o Antônio Castro Alves faleceu o Boi Corre Campo nunca mais foi o mesmo. O Alberto de Castro Alves um tempo desses veio aqui e pediu pra tomar conta do Mimosinho e eu concordei. Hoje estou aqui nessa cadeira de rodas não reclamo de nada e pode crer, sou feliz, ainda mais por contar com amigos como você e tantos outros que me visitam todo final de semana. Sinto que fiz alguma coisa pela nossa cultura, mas, chegou a hora de ficar apenas na torcida.
Zk – E o Flor do Maracujá, você ainda vai prestigiar?
Batista – Hoje não! Acontece que fui vítima de derrame cerebral e por algum tempo fiquei impossibilitado de sair de casa, ainda fui lá apreciar algumas vezes. Depois que perdi uma perna por infecção e fiquei numa cadeira de rodas resolvi não ir mais. Assisto pela televisão o show do Silvio Santos cantando as todas do Corre Campo.
Zk – Para encerrar?
Batista – Coloca aí que sou casado com a dona Fancelina Gomes da Silva e temos três filhas.
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