O
artista que precisa ser mais valorizado
Afonso Ligório |
Seu
nome está firmado na entrada da Galeria de Artes da Casa da Cultura
Ivan Marrocos, porém, a foto foi retirada sem nenhuma explicação.
Pra completar, nenhum funcionário da Casa sabe alguma coisa sobre a
história do artista Afonso Ligório. Assim sendo, para atender a
solicitação do Superintendente da Setur Júlio Olivar que está
divulgando Rondônia numa Feira de Turismo em São Paulo, passei
praticamente dois dias, correndo atrás de quem sabia sobre a vida do
artista. Até que me informaram que na rua D. Pedro II subesquina com
a Joaquim Nabuco, onde funciona uma academia de musculação. “Você
vai encontrar a sobrinha do Afonso Ligório senhora Terezinha de
Jesus Oliveira Macedo, ela sabe tudo da vida dele”. Ao chegar ao
endereço fui recebido com a maior gentileza e então fomos direto ao
assunto, afinal de contas, o Júlio estava esperando a história em
São Paulo.“Tudo dele é parecido, nasceu no dia 04 do 04 de 1934 e
faleceu no dia 8 do 08 não lembro direito se em 79 ou 80”.
Aproveitamos
a deixa, para também saber sobre a vida de dona Terezinha que foi
criada pela mãe de Afonso Ligório e tinha em seu tio artista, a
garantia da proteção.“Ele me trouxe nas costas dentro de um
jamanxim
de
Ji Paraná até Porto Velho a pé”.
A
partir de agora, a história do artista plástico que pintou a cúpula
da catedral de Porto Velho, fez as pinturas da igreja N.S. de Fátima,
o teto da lanchonete J. Lima e muitas outras obras, passa a ser do
conhecimento de todos.
ENTREVISTA
Zk
– Nossa missão é divulgar a história do Afonso Ligório. O que a
senhora sabe a respeito desse artista que empresta seu nome à
Galeria de Artes da Casa da Cultura Ivan Marrocos?
Terezinha
– Fui criada pela mãe dele Francisca Duarte de Souza. A família
dele veio de Areia Branca uma cidade do Rio Grande do Norte. Ela
contava que o pai do Afonso morreu quando ele tinha apenas 8 anos de
idade e então vieram para a Amazônia. Afonso segundo sua mãe,
sempre teve o dom da escultura desde criança, ele nunca teve um
mestre pintava por dom.
Zk
– Existe alguma obra dele criada naquele tempo?
Terezinha
– Acontece que naquele tempo, o material era muito escasso, a gente
era pobre. Tinha muito trabalho bonito e como o material não era bom
tudo se perdeu com o tempo. Um dia na Catedral de Porto Velho, uma
menina me chamou e disse: “Os padres mandaram passar tinta nas
pinturas do Afonso, isso não pode acontecer”. Fui lá olhar e
vi.Como as pinturas foram feitas nas paredes que estavam com
infiltração, não tinha como salvá-las.
Zk
– A senhora sabe a data do nascimento dele?
Terezinha
– Por coincidência, hoje (4 de abril), fiz uma ficha e quando
coloquei a data me lembrei: Ele nasceu no dia 4 de abril de 1934 se
não estou enganada. As datas da vida dele são assim interessantes,
veja ele morreu no dia 08.08.1979/80. Fui criada pela mãe dele vivi
parte da minha infância junto com ele.
Zk
– E a relação dele com a igreja católica?
Terezinha
– Ele sempre trabalhou com os padres, veio desde o Ângelo Cerri
porém, o principal foi o padre Humberto. Pintou muitas obras, que
estão na Catedral, inclusive aquela que está na cúpula da igreja,
tem obras na igreja Nossa Senhora de Fátima. O padre Mário gostava
muito dele. A imagem de Nossa Senhora de Fátima e os Três Pastores
que está na entrada da igreja é dele. Os apóstolos que ficam na
rampa também é obra dele.
Zk
– A senhora sabe informar qual foi o último trabalho do artista
Afonso Ligório?
Terezinha
– Claro que sei, foi a imagem de São João Bosco encomendada pelo
pároco da Igreja Catedral de Ji Paraná. Essa escultura ficava na
torre da igreja. Me disseram que iam demolir a igreja para construir
outra, não sei se nessa outra igreja de São João Bosco, vão
colocar a imagem esculpida por ele.
Zk
– Como era a vida do artista Afonso Ligório, aonde vocês moraram
em Porto Velho?
Terezinha
– Como já disse, todo artista tem uma parte de doido. O dia que
não estava para trabalhar, saia visitando a casa dos amigos e
parentes, era o dia todinho assim, porém, quando estava para pintar,
ele sentava, entrava pela noite, amanhecia o dia, pintando sem parar.
Ainda bem que a maioria de seus dias foi pintando. Moramos na D.
Pedro II aí nosso padastro vendeu e o dinheiro não deu pra comprar
outra casa, então fomos morar de aluguel, no Areal na Campos Sales,
na 13 de Setembro. O Afonso ainda chegou a construir uma casinha ali
na rua Rio de Janeiro, mas, como ele era meio perturbado, metia os
pés pelas mãos, vendeu a casa e ninguém sabe o que fez com o
dinheiro.
Zk
– Ele teve filhos, com quem ele foi casado?
Terezinha
– Teve apenas um filho, estava em Goiânia quando soube que esse
único filho do Afonso havia morrido. A mulher com quem ele casou e
lhe deu esse único filho chamava-se Raimunda Silva Souza. Depois ele
teve diversas mulheres (amantes), uma época ele viveu com uma
professora que se chamava Elza. O interessante era que apesar de
praticamente sua vida artística ter sido feita dentro da igreja
católica, ele não era de frequentar missa, novena essas coisas da
religião. O negócio dele era pintar os santos e os anjos.
Zk
– Quando a família dele veio para Rondônia?
Terezinha
– Eles vieram pra cá no tempo que estavam recrutando os Soldados
da Borracha. Foi assim: O pai dele faleceu quando ele era muito
criança então, o marido da tia irmã da mãe dele, foi recrutado
como soldado da Borracha e trouxe toda a família inclusive o Afonso
Ligório.
Zk
– Ja falamos bastante sobre o Afonso Ligório e a senhora é
artista também?
Terezinha
– Família de artista sempre passa uma veiazinha. Eu aprendi a
pintar com ele. Só pinto paisagem e pássaros. O artista plástico
não gosta de pintar e ver seus quadros guardados, minha filha me
pediu um quadro e certa vez fui a casa dela e vi meu quadro atrás do
guarda-roupa, então disse pra ela: você vende esse quadro pra quem
vai pendurar na parede. Quando morávamos no areal, estava com mais
ou menos 14 anos, cheguei a sustentar a família com 12 pessoas,
pintando azulejo de parede, pintava durante três dias e o restante
da semana era vendendo. Depois casei veio os filhos e fui deixando a
pintura de lado, de vez em quando lembro e pinto alguma coisa.
Zk
– A senhora nasceu em Porto Velho?
Terezinha
– Nasci no Amazonas em Coari na época era Seringal Coari. Meu pai
quando minha vó veio, ele já estava pela Amazônia, foi das
primeiras levas dos Soldados da Borracha. Meu pai que era irmão do
Afonso veio parar em Ouro Preto (hoje Ouro Preto D'Oeste) que também
era seringal, porém, faleceu muito novo. Meu tio Afonso Ligório
também faleceu muito novo, ele estava se a memória não me falha
com 47 anos. Meu tio Afonso era muito estragado, bebia e fumava
demais.
Zk
– O Afonso morreu de que?
Terezinha
– Morreu com um tumor (Câncer) no Exófago, não tinha o
tratamento que tem hoje, se tivesse, com certeza, ele teria vivido
mais um pouquinho. Ele dizia no leito do hospital: “Não deixe me
cortar, deixa eu morrer inteiro, não vai ter cura mesmo”. O Dr.
Nobel na época tinha uma clínica na Pinheiro Machado, me chamou e
disse, que tinha que fazer uma pequena cirurgia para colocar uma
sonda para ele se alimentar o Dr. Me disse, se não fizermos isso, a
fome vai matar ele antes da doença. Ele não consentia: “Não
minha filha, deixa eu morrer inteiro”.
Zk
– Como a família recebeu a homenagem ao ver o nome dele ser
colocado na Galeria de Artes da Casa da Cultura numa campanha da
artista plástica Rita Queiroz?
Terezinha
– Eu estive na solenidade juntamente com a Irmã dele que também
já faleceu. Quando passo ali pela Carlos Gomes entro pra olhar,
Aliás entrava pra olhar aquela fotozinha dele, agora tiraram a foto
de lá sem dar nenhuma explicação.
Zk
– Quantos filhos a senhora tem?
Terezinha
– São quatro filho o Zezinho (José Macedo Lima) que toma conta da
Academia, a Maria Auxiliadora Macedo Lima que trabalha na ouvidoria
do hospital do câncer. Tem dois em Goiânia a Ângela Maria Macedo
Lima e o Ângelo Roberto Macedo Lima.
Zk
– Vamos encerra essa conversa! Tem mais alguma coisa sobre o Afonso
Ligório por aí?
Terezinha
– Tem uma aventura. Eu estava com três anos de idade e meu pai
morava no seringal Ouro Preto que hoje é cidade e minha mãe com
muita vontade de sair do seringal, - no mato a gente usa um negócio
que se chama jamanxim
- Minha me colocou dentro do jamanchim colocou nas costas do Tio
Afonso e ele me trouxe de Ji Parana até Porto Velho.
Naquele tempo não existia estrada era só picada. Depois de alguns
anos, com os ônibus já trafegando no trecho falei pra
ele: Tio sempre pensei que o senhor era meio doido, agora sei que o
senhor não meio doido, é doido total.
Zk
– Parece que houve um erro na certidão de óbito é verdade?
Terezinha
– Pois é quando saiu o atestado de óbito não saiu Afonso
Ligório, saiu Afonso Libário. Tentei tirar isso e não consegui.
Como ele coitado não tinha deixado bens nem nada, ficou por
isso mesmo. Ele está enterrado no cemitério de Santo
Antônio na Ala 34, sepultura 35. Tem o túmulo aguardando
a visita de seus admiradores. Obrigada!
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