Por
Pedro Paulo Malta
No
momento em que a música brasileira comemora o centenário de
lançamento do primeiro samba de sucesso, “Pelo telefone”, o
presente vem em forma de livro: a segunda edição – revista e
ampliada – de “Serra, Serrinha, Serrano: o Império do samba”,
obra de Rachel Valença e Suetônio Valença que refaz a história de
uma das escolas de samba mais tradicionais do carnaval carioca: o
Império Serrano. O lançamento, pela editora Record, atualiza em 36
anos a primeira edição do livro, publicada em 1981 e esgotada pouco
depois, transformando-se numa raridade disputada a peso de ouro em
sebos de todo o país.
Desde
então, Rachel Valença seguiu acompanhando de perto a escola de seu
coração, participando dos carnavais, anotando fatos relevantes e
guardando heranças que recebia das famílias de antigos imperianos.
Tocou na bateria, foi diretora cultural e vice-presidente em dois
mandatos – após o mais recente (entre 2006 e 2010), sentiu-se
pronta para se dedicar à nova edição do livro. Já sem a parceria
de Suetônio (falecido em 2006), desengavetou seus alfarrábios,
vasculhou arquivos de jornais e fez novas entrevistas para
complementar as histórias já contadas e acrescentar novos fatos –
como o histórico e profético enredo “Bum bum paticumbum
prugurundum”, que valeu à escola alviverde seu título mais
recente, em 1982, um ano após a primeira edição do livro.
E
assim, nas 433 páginas da nova edição – mais do que o triplo em
comparação às 129 originais – estão os “episódios
relicários” dessa história: a começar pelo levante de sambistas
do Morro da Serrinha (na Zona Norte do Rio) contra o autoritarismo do
presidente da escola local, o Prazer da Serrinha. O resultado do
levante é o próprio Império Serrano – fundado por aqueles
dissidentes, em 23 de março de 1947. Uma história iniciada, à luz
da democracia, na casa de D. Eulália do Nascimento, que aliás é
personagem fundamental no livro de Rachel e Suetônio, com sua língua
afiada, especialmente quando o tema é a principal rival do Império,
a Portela, escola do bairro vizinho de Oswaldo Cruz.
A
história também é contada através da atuação decisiva de outros
personagens, como o pai-de-santo Elói Antero Dias, responsável por
providenciar os instrumentos da primeira bateria da escola. E como o
evangélico Silas de Oliveira, que terá que romper com os próprios
pais para se tornar o maior nome da história do samba-enredo, como
compositor dos antológicos “Aquarela brasileira” e “Heróis da
liberdade”, este último em parceria com Manoel Ferreira e Mano
Décio da Viola. E o que dizer da enfermeira Ivone Lara, que
aproveitou o descanso no expediente do Hospital Gustavo Riedel para
se tornar a primeira mulher a assinar um samba-enredo: “Os cinco
bailes da história do Rio”, em parceria com Silas de Oliveira e
Bacalhau.
Entre
os destaques da nova edição estão os boxes criados por Rachel
Valença para contar, em primeira pessoa, suas inúmeras histórias
no dia-a-dia do Império e os bastidores da pesquisa para o livro. Há
também os perfis de personagens mais recentes desses 70 anos de
história: sejam notáveis como os compositores Wilson das Neves e
Arlindo Cruz, sejam ritmistas, casais de mestre-sala e
porta-bandeira, baianas, serventes, passistas, vendedores de rua,
destaques, torcedores, presidentes... Todos componentes fundamentais
desta escola que, se nos tempos atuais não samba à vontade no
carnaval das “Super Escolas de Samba S/A”, se orgulha como
nenhuma outra agremiação de sua própria história.
Nenhum comentário:
Postar um comentário