A
história da Vila Tupi – Salve Jorge
Sexta feira passada dia 03,
no inicio do ensaio da escola de samba Acadêmicos do São João Batista no Espaço
Cultural da Associação Salve Jorge na Vila Tupi, quando o presidente da escola
Alberto Rodrigues – Pai Beto informou aos brincantes da agremiação, que a
Funcultural em comum acordo com os dirigentes das escolas e da Fesec, só vai
realizar os desfiles das escolas de samba no sábado de aleluia, ou seja, no dia
15 de abril, aproveitei para bater um papo com um dos primeiros moradores da
Vila Tupi o amigo de longas datas, João Jorge da Silva que nos contou sobre sua
vida de “saqueiro” na feira Modelo na década de 1950/60 e de como foi criada a
Vila Tupi. “Tudo começou em conseqüência de uma enchente que alagou a Baixa da
União e as casas que ficavam nas proximidades do Canal Santa Bárbara na década
de 1980”. O ex gerente da Cia. Aérea Varig/Cruzeiro fez uma viagem na
Porto Velho dos anos cinqüenta até os dias de hoje. Enquanto o samba comia no
centro no terreiro do Salve Jorge nosso papo foi fluindo. Vejam no que deu.
ENTREVISTA
Zk – Vamos começar pela sua
identificação?
João Jorge – Sou João Jorge
da Silva desde 2 de abril de 1955. Nasci na maternidade Darcy Vargas em Porto
Velho, meu pai Nealdo da Silva foi seringueiro no Acre e junto com minha mãe
Ozires Aguiar da Silva e veio pra cá. Toda minha família é acreana na época,
meu bisavô era dono de Batelão e transportava borracha. Fui criado na feira
livre, minha mãe tinha banca de vender comida e meu pai também era comerciante
na feira. Mamãe sempre dizia, tem que estudar meu filho.
Zk – Fala sobre a feira onde
seus pais tinham banca?
João Jorge – O nome era
Feira Modelo e funcionava num barracão justamente onde hoje é o Mercado
Central. A gente viveu em paz ali trabalhando até quando o Mercado Municipal (hoje
Mercado Cultural) pegou fogo em 1966, aí os comerciantes foram para a Feira
Modelo e o negócio dos feirantes antigos foi prejudicado. Meu pai tinha banca
de verduras e legumes enquanto minha mãe vendia comida, aliás, a banca da mamãe
era muito freqüentada, pois ela cozinhava muito bem.
Zk – O que você fazia na
feira?
João Jorge – Minha mãe queria
que a gente estudasse, mesmo assim, a gente tinha que fazer alguma coisa, foi
então que resolvi ser vendedor de saco. Esse saco eu mesmo fazia. A gente ia às
construções e comprava os sacos de cimento e de suas folhas fazia o saco que
era vendido para os freqüentadores da feira colocar suas compras. Era uma
disputa danada entre os “saqueiros”, a gente ficava gritando pelo meio da
feira: Saqueieirooo. Um dos meus melhores fregueses era o Cansanção do Posto Cansanção
um posto que foi inaugurado no KM – 6 da BR-29 cujo trecho hoje é a avenida
Nações Unidas. No posto Cansanção não vendia só combustível, funcionava também
como lanchonete e restaurante por isso quando ele chegava à feira, me escalava
para acompanhá-lo em sua compras, os peixeiros colocavam aqueles tambaquis de
30/40 quilos nos sacos que eu vendia e mandavam levar pro carro do seu Cansanção
era um sufoco, só que a gorjeta era ótima. Tenho quase certeza que o Posto
Cansanção, foi o primeiro Posto de Combustível de Porto Velho a funcionar com loja
de conveniência.
Zk – Vocês moravam em qual local da cidade?
João Jorge – Morávamos na
rua Prudente de Moraes justamente onde hoje a turma chama de “Baixada Fluminense”
entre o Mocambo e o Areal.
Zk – Como surgiu a Vila
Tupi?
João Jorge – A Vila Tupi
surgiu em conseqüência da alagação da Baixa da União e do Santa Bárbara. Quero
enaltecer o governador Jorge Teixeira – Teixeirão e o prefeito Francisco Paiva
que criaram a Vila Tupi toda planejada, inclusive eles entregaram pra gente a
planta da casa para a gente construir e ainda deram para cada morador 80 Mil
Cruzeiros. Minha mãe chorava muito quando disseram que a gente tinha que sair
do local onde a gente morava, isso é comum, ninguém quer sair do seu habitat,
não é mesmo! Eu fui um dos que mais incentivou mamãe a aceitar: Mãe vamos
embora, aqui vai continuar alagando e a gente perdendo nossas coisas, nessa
época eu estava servindo o exército, já era “otoridade” na época da ditadura,
quem mandava era eu, meu irmão que hoje é Procurador Geral do Estado Dr. Juraci
Jorge eu dizia pra ele agora vamos embora vumbora!
Zk – O governo construiu a
casa ou deu apenas o terreno?
João Jorge – Nós fundamos a
Vila Tupi. Como já disse o governo pagou uma indenização de 80 Mil Cruzeiros e
a prefeitura tava lá com as caçambas para fazer nossa mudança. Não teve esse
negócio de polícia forçando nossa mudança, era apenas a equipe da prefeitura.
Eles forneceram inclusive a planta da construção das casas, só que poucos
seguiram aquela planta, cada um construiu sua casa do jeito que achou melhor.
Zk – Quantas famílias foram
transferidas para a Vila Tupi naquela época?
João Jorge – Foram
aproximadamente 30 famílias. Cada uma família tinha direito apenas a um
terreno. A minha casa eu comprei depois, quem ganhou terreno aqui foram os meus
pais, a casa deles fica la na frente da Vila na rua Poti. Esse terreno aqui
onde funciona o Salve Jorge na rua Juruna foi comprado depois. Quem teve a
idéia de colocar nome de índio nas ruas da Vila foram as assistentes sociais
entre elas a Dra. Alba que ainda mora em Porto Velho, que vieram dar
assistência às nossas famílias, eram três assistentes sociais, todas de fora,
com aquele negócio de aqui tinha muito índio, acho que por isso, acharam de
batizar as ruas da Vila com nomes indígenas.
Zk – Quantos daquela época
ainda moram na Vila?
João Jorge – Poucos, muito
poucos, a maioria foi embora. O Ocampo Fernandes veio de Guajara Mirim muito
depois e comprou a casa onde mora até hoje.
Zk – E o Boi Bumbá
Marronzinho?
João Jorge – Esse é o boi da
nossa Vila. Todo mundo falava do Estevam o presidente do bumbá, porque ele não
entrega os troféus e as medalhas individuais dos personagens. Um dia cheguei
com ele e falei: Estevam vamos colocar o boi dentro da tranqüilidade, entregando
a premiação dos brincantes que fizerem jus. Ele não gostou muito não, mas,
fizemos. Meu filho era o “doutor cachaça” da brincadeira e sempre ganhava como
melhor no Flor do Maracujá, mais não recebia a medalha porque o Estevam dizia
que era do Boi e ficava com a premiação em casa. Quando me propus a ajudar o
grupo realizamos uma festa na quadra da igreja e entregamos os troféus a cada
um. O Estevam merece toda nossa consideração, só em a pessoa ter a paciência de
colocar um grupo folclórico como ele faz com o Marronzinho já é uma coisa muito grande.
Zk – E a Associação Salves
Jorge como surgiu?
João Jorge – Eu sou Jorge,
aí comprei um empreendimento aí ao lado, a idéia era quando eu me aposentasse
tocar uma distribuidora de bebidas, aí meu filho disse, pai vamos botar pagode,
vamos botar isso e aquilo eu ainda relutei: não quero saber disso não meu
filho. Fui voto vencido e como estava na época da novela falei: então vamos
colocar o nome de Salve Jorge e o negócio pegou. Hoje abrimos o espaço para todo
segmento cultural. Temos seresta, forró, samba, pagode as outras associações
realizam eventos aqui e não cobramos nada. Aqui já ensaiou a escola de samba
Acadêmicos do Armário Grande do meu amigo Cabeleira e este ano quem está
ensaiando é a escola de samba Acadêmicos do São João Batista que tem meu amigo
Silfarney como Mestre da Bateria.
Zk – O que mais a Associação
Salve Jorge promove?
João Jorge – Temos programa
na rádio Rio Madeira FM e agora vamos pra rádio Cultura FM com o programa
“Momento Salve Jorge”, a idéia é transmitir ao vivo eventos culturais, quero
aqui fazer um convite a você Silvio Santos para participar com a gente desse
empreendimento.
Zk – Você é funcionário
público?
João Jorge – No governo
estadual sou diretor de colégio há 20 anos. Sou graduado em história e pós
graduado em gestão escolar pela UNIR. Sou casado com a dona Lenir e temos
quatro filhos, Jorge Junior, Jeane, Juraci e Jean. Estou esperando a
transposição para poder me aposentar.
Zk – Antes de ser
funcionário público?
João Jorge –
Trabalhei na Companhia Aérea Cruzeiro do Sul depois Varig eu era o gerente, o
representante aqui era o seu Bechara, tinha meu amigo Garcia o Dôque. Deixa eu
lembrar de nós dois, da nossa amizade, no tempo que freqüentávamos a Taba do
Cacique no tempo que a gente jogava bozó (jogo de dado) no bar do Floriano onde
mataram o Pimentel. Apesar de gostar de carnaval nunca brinquei em nenhuma
escola de samba apesar de ser Diplomatas. Cheguei a desfilar pelo bloco do meu
cunhado “Bloco do Bigodudo - Bafo da Onça”. (cantando) “Tempo bom, não volta mais,
saudades de tempo atrás...”.
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