sábado, 4 de fevereiro de 2017

ENTREVISTA - João Jorge da Silva

A história da Vila Tupi – Salve Jorge

Sexta feira passada dia 03, no inicio do ensaio da escola de samba Acadêmicos do São João Batista no Espaço Cultural da Associação Salve Jorge na Vila Tupi, quando o presidente da escola Alberto Rodrigues – Pai Beto informou aos brincantes da agremiação, que a Funcultural em comum acordo com os dirigentes das escolas e da Fesec, só vai realizar os desfiles das escolas de samba no sábado de aleluia, ou seja, no dia 15 de abril, aproveitei para bater um papo com um dos primeiros moradores da Vila Tupi o amigo de longas datas, João Jorge da Silva que nos contou sobre sua vida de “saqueiro” na feira Modelo na década de 1950/60 e de como foi criada a Vila Tupi. “Tudo começou em conseqüência de uma enchente que alagou a Baixa da União e as casas que ficavam nas proximidades do Canal Santa Bárbara na década de 1980”. O ex gerente da Cia. Aérea Varig/Cruzeiro fez uma viagem na Porto Velho dos anos cinqüenta até os dias de hoje. Enquanto o samba comia no centro no terreiro do Salve Jorge nosso papo foi fluindo. Vejam no que deu.

ENTREVISTA


Zk – Vamos começar pela sua identificação?
João Jorge – Sou João Jorge da Silva desde 2 de abril de 1955. Nasci na maternidade Darcy Vargas em Porto Velho, meu pai Nealdo da Silva foi seringueiro no Acre e junto com minha mãe Ozires Aguiar da Silva e veio pra cá. Toda minha família é acreana na época, meu bisavô era dono de Batelão e transportava borracha. Fui criado na feira livre, minha mãe tinha banca de vender comida e meu pai também era comerciante na feira. Mamãe sempre dizia, tem que estudar meu filho.
Zk – Fala sobre a feira onde seus pais tinham banca?
João Jorge – O nome era Feira Modelo e funcionava num barracão justamente onde hoje é o Mercado Central. A gente viveu em paz ali trabalhando até quando o Mercado Municipal (hoje Mercado Cultural) pegou fogo em 1966, aí os comerciantes foram para a Feira Modelo e o negócio dos feirantes antigos foi prejudicado. Meu pai tinha banca de verduras e legumes enquanto minha mãe vendia comida, aliás, a banca da mamãe era muito freqüentada, pois ela cozinhava muito bem.
Zk – O que você fazia na feira?
João Jorge – Minha mãe queria que a gente estudasse, mesmo assim, a gente tinha que fazer alguma coisa, foi então que resolvi ser vendedor de saco. Esse saco eu mesmo fazia. A gente ia às construções e comprava os sacos de cimento e de suas folhas fazia o saco que era vendido para os freqüentadores da feira colocar suas compras. Era uma disputa danada entre os “saqueiros”, a gente ficava gritando pelo meio da feira: Saqueieirooo. Um dos meus melhores fregueses era o Cansanção do Posto Cansanção um posto que foi inaugurado no KM – 6 da BR-29 cujo trecho hoje é a avenida Nações Unidas. No posto Cansanção não vendia só combustível, funcionava também como lanchonete e restaurante por isso quando ele chegava à feira, me escalava para acompanhá-lo em sua compras, os peixeiros colocavam aqueles tambaquis de 30/40 quilos nos sacos que eu vendia e mandavam levar pro carro do seu Cansanção era um sufoco, só que a gorjeta era ótima. Tenho quase certeza que o Posto Cansanção, foi o primeiro Posto de Combustível de Porto Velho a funcionar com loja de conveniência.
 Zk – Vocês moravam em qual local da cidade?
João Jorge – Morávamos na rua Prudente de Moraes justamente onde hoje a turma chama de “Baixada Fluminense” entre o Mocambo e o Areal.
Zk – Como surgiu a Vila Tupi?
João Jorge – A Vila Tupi surgiu em conseqüência da alagação da Baixa da União e do Santa Bárbara. Quero enaltecer o governador Jorge Teixeira – Teixeirão e o prefeito Francisco Paiva que criaram a Vila Tupi toda planejada, inclusive eles entregaram pra gente a planta da casa para a gente construir e ainda deram para cada morador 80 Mil Cruzeiros. Minha mãe chorava muito quando disseram que a gente tinha que sair do local onde a gente morava, isso é comum, ninguém quer sair do seu habitat, não é mesmo! Eu fui um dos que mais incentivou mamãe a aceitar: Mãe vamos embora, aqui vai continuar alagando e a gente perdendo nossas coisas, nessa época eu estava servindo o exército, já era “otoridade” na época da ditadura, quem mandava era eu, meu irmão que hoje é Procurador Geral do Estado Dr. Juraci Jorge eu dizia pra ele agora vamos embora vumbora!
Zk – O governo construiu a casa ou deu apenas o terreno?
João Jorge – Nós fundamos a Vila Tupi. Como já disse o governo pagou uma indenização de 80 Mil Cruzeiros e a prefeitura tava lá com as caçambas para fazer nossa mudança. Não teve esse negócio de polícia forçando nossa mudança, era apenas a equipe da prefeitura. Eles forneceram inclusive a planta da construção das casas, só que poucos seguiram aquela planta, cada um construiu sua casa do jeito que achou melhor.
Zk – Quantas famílias foram transferidas para a Vila Tupi naquela época?
João Jorge – Foram aproximadamente 30 famílias. Cada uma família tinha direito apenas a um terreno. A minha casa eu comprei depois, quem ganhou terreno aqui foram os meus pais, a casa deles fica la na frente da Vila na rua Poti. Esse terreno aqui onde funciona o Salve Jorge na rua Juruna foi comprado depois. Quem teve a idéia de colocar nome de índio nas ruas da Vila foram as assistentes sociais entre elas a Dra. Alba que ainda mora em Porto Velho, que vieram dar assistência às nossas famílias, eram três assistentes sociais, todas de fora, com aquele negócio de aqui tinha muito índio, acho que por isso, acharam de batizar as ruas da Vila com nomes indígenas.
Zk – Quantos daquela época ainda moram na Vila?
João Jorge – Poucos, muito poucos, a maioria foi embora. O Ocampo Fernandes veio de Guajara Mirim muito depois e comprou a casa onde mora até hoje.
Zk – E o Boi Bumbá Marronzinho?
João Jorge – Esse é o boi da nossa Vila. Todo mundo falava do Estevam o presidente do bumbá, porque ele não entrega os troféus e as medalhas individuais dos personagens. Um dia cheguei com ele e falei: Estevam vamos colocar o boi dentro da tranqüilidade, entregando a premiação dos brincantes que fizerem jus. Ele não gostou muito não, mas, fizemos. Meu filho era o “doutor cachaça” da brincadeira e sempre ganhava como melhor no Flor do Maracujá, mais não recebia a medalha porque o Estevam dizia que era do Boi e ficava com a premiação em casa. Quando me propus a ajudar o grupo realizamos uma festa na quadra da igreja e entregamos os troféus a cada um. O Estevam merece toda nossa consideração, só em a pessoa ter a paciência de colocar um grupo folclórico como ele faz com o Marronzinho já  é uma coisa muito grande.
Zk – E a Associação Salves Jorge como surgiu?
João Jorge – Eu sou Jorge, aí comprei um empreendimento aí ao lado, a idéia era quando eu me aposentasse tocar uma distribuidora de bebidas, aí meu filho disse, pai vamos botar pagode, vamos botar isso e aquilo eu ainda relutei: não quero saber disso não meu filho. Fui voto vencido e como estava na época da novela falei: então vamos colocar o nome de Salve Jorge e o negócio pegou. Hoje abrimos o espaço para todo segmento cultural. Temos seresta, forró, samba, pagode as outras associações realizam eventos aqui e não cobramos nada. Aqui já ensaiou a escola de samba Acadêmicos do Armário Grande do meu amigo Cabeleira e este ano quem está ensaiando é a escola de samba Acadêmicos do São João Batista que tem meu amigo Silfarney como Mestre da Bateria.
Zk – O que mais a Associação Salve Jorge promove?
João Jorge – Temos programa na rádio Rio Madeira FM e agora vamos pra rádio Cultura FM com o programa “Momento Salve Jorge”, a idéia é transmitir ao vivo eventos culturais, quero aqui fazer um convite a você Silvio Santos para participar com a gente desse empreendimento.
Zk – Você é funcionário público?
João Jorge – No governo estadual sou diretor de colégio há 20 anos. Sou graduado em história e pós graduado em gestão escolar pela UNIR. Sou casado com a dona Lenir e temos quatro filhos, Jorge Junior, Jeane, Juraci e Jean. Estou esperando a transposição para poder me aposentar.
Zk – Antes de ser funcionário público?
João Jorge – Trabalhei na Companhia Aérea Cruzeiro do Sul depois Varig eu era o gerente, o representante aqui era o seu Bechara, tinha meu amigo Garcia o Dôque. Deixa eu lembrar de nós dois, da nossa amizade, no tempo que freqüentávamos a Taba do Cacique no tempo que a gente jogava bozó (jogo de dado) no bar do Floriano onde mataram o Pimentel. Apesar de gostar de carnaval nunca brinquei em nenhuma escola de samba apesar de ser Diplomatas. Cheguei a desfilar pelo bloco do meu cunhado “Bloco do Bigodudo - Bafo da Onça”. (cantando) “Tempo bom, não volta mais, saudades de tempo atrás...”.

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