Mitos
e lendas a caminho do sertão
A partir desta e nas
próximas edições até o final do ano, vamos publicar entrevistas com os
responsáveis pelas entidades culturais que se destacaram na temporada. Os
artistas solos também merecerão nossa atenção. Para começar a série convidamos
o principal responsável pelo grupo O Imaginário Chicão Santos, que discorreu
sobre as atividades desenvolvidas durante o ano de 2013 em especial sobre a
circulação da caravana “Mitos e Lendas - A Caminho do Sertão” vencedora do
Prêmio Petrobras cuja principal atração, é o espetáculo “Varadouro”. Chicão
fala das dificuldades enfrentadas para a realização do Festival de Teatro
Amazônia Encena na Rua. “Em 2014 o Sesc assume a integralidade da realização do
Festival Amazônia Encena na Rua”. Porém chamamos a atenção do leitor para a
parte sobre a pesquisa realizada pela equipe do O Imaginário que contou com
pessoas residentes no Rio de Janeiro e em Rondônia. Com a Caravana Mitos e
Lendas a Caminho do Sertão O Imaginário levou o nome de Rondônia ao nordeste
onde passou dois meses (outubro e novembro) apresentando a peça Varadouro.
Vamos às histórias do grupo
de teatro considerado pela coluna do Zekatraca como destaque de 2013, segmento
do teatro.
ENTREVISTA
‘
Zk – Que tal aproveitar para
fazer um balanço das ações do O Imaginário em 2013?
Chicão Santos – Na
verdade o ano de 2013 foi muito importante pra gente, porque começas fazendo uma
Caravana que foi a primeira, saiu pelas Trilhas de Rondon e chegamos até a
Chapada dos Guimarães, visitamos 17 cidades. Acontece que em 2007 a gente tinha
assumido compromisso com as prefeituras de que se elas recuperassem os Postos
Telegráficos retornaríamos para ver o que foi feito.
Zk – As prefeituras
cumpriram o acordado?
Chicão Santos – Para nossa
satisfação, todo Posto Telegráficos foram recuperados, uns funcionando com
alguma atividade, outros fechados, mas, recuperado. Aí fizemos um trabalho
durante todo o ano e agora fechando o ano com essa nova Caravana patrocinada
pela Petrobras chamada “Mitos e Lendas a Caminho do Sertão”.
Zk – A caminho de qual
sertão?
Chicão Santos – Fomos para
São Luiz no Maranhão e João Pessoa na Paraíba. Já realizamos várias caravanas,
mas, essa teve um diferencial que foi justamente, trabalhar formação de plateia.
Passamos mais tempo nas cidadesfazendo esse papel juntamente com os nossos
parceiros. Em São Luiz tivemos uma realidade super bacana, quando chegamos
estava acontecendo a Feira do Livro um evento que domina a cidade inteira e ali
encontramos todo mundo que trabalha com teatro e passamos todo o mês de
outubro,indo a escolas, em locais onde acontece sistematização do ensino do
teatro. No final da nossa caravana no Maranhão, tivemos o privilégio de
terminar com a Mostra Guajajara de Teatro do Sesc. São Luiz é uma cidade que
tem uma produção teatral muito grande.
Zk – Em João Pessoa?
Chicão Santos – Por trinta
dias ocupamos o Galpão Usina do Teatro que é de um grupo parceiro nosso “Quem
tem boca é pra gritar”. Foi a primeira vez que eles usaram o Galpão para
apresentações, foram seis apresentações do espetáculo “Varadouro”, além disso,
fizemos o trabalho de formação de plateia dentro das escolas e dentro das sedes
de outros grupos. Um fato muito interessante foi que em todas as seis
apresentações, lotamos o Galpão, além disso, encontramos outros parceiros como
o Grupo “Maria Cutia” que estava por lá fazendo circulação e juntos nos
apresentamos na praça da Paz, foi muito bacana porque eles já vieram em Porto
Velho duas vezes.
Zk – Como surgiu a idéia para
montar o Varadouro?
Chicão Santos – Na verdade
quando começamos a fazer o projeto de pesquisa, uma investigação cênica sobre
tudo aquilo que estava relacionado à construção da EFMM, estabelecemos uma
trilogia que finalizou com o Varadouro. Primeiro foi “Filha da Mata” que fez o
caminho do universo feminino, falando dessas mulheres que vieram pra cá, que
também teve uma circulação nacional e chegou até a Mostra Latino-americana.
Depois trabalhamos a “Ferrovia dos Invisíveis – Narrativa do Outro Lado” que
foi um trabalho experimental com nossos alunos do Tapíri, onde falamos da saga
que foi a Construção da Estrada de Ferro, com as diferentes nacionalidades que
vieram pra cá, abordando justamente a questão dos homens, a questão masculina
dentro da obra. Varadouro é o viés do aventureiro.
Zk -Como foi desenvolvida a
pesquisa que originou o espetáculo Varadouro?
Chicão Santos – A gente
tinha essa vontade de contar essa história e para nossa felicidade, ganhamos o
Prêmio Itaú pra fazer a pesquisa investigativa desses acontecimentos eVaradouro
traz justamente a história desses aventureiros, dos coronéis de barranco, dos
seringalistas, desses homens que vieram para cá explorar. A gente coloca de
forma bem fragmentada dentro do Varadouro rodas essas intenções dos
aventureiros, tanto dos portugueses que vieram pra e até acabaram reforçando a
lenda do Boto, inclusive no seringal da Rita Queiroz “Santa Catarina” a gente
identificou o “Barão Abelha”.
Zk – Fala sobre a história
desse Barão?:
Chicão Santos – Segundo nossa
pesquisa, possivelmente ele era português que deve ter desvirtuado a sua rota e
ali se instalou e virou seringalista e “Coronel de Barranco”. Imagina isso a
cento e poucos anos atrás, um europeu no meio da floresta vestido de branco.
Essa pesquisa do Varadouro começamos em Porto Velho, fomo pro Rio de Janeiro em
Petrópolis fizemos toda uma investigação da assinatura do Tratado de
Petrópolis, percorremos também o Rio Madeira até Manaus, fazendo todo o
processo inverso da caminhada dos trabalhadores que vieram trabalhar na Madeira
Mamoré. Para nossa surpresa identificamos alguns fatos importantes que diz
respeito a tanta religiosidade e também com a presença estrangeira aqui. Dona
Preta (benzedeira) deu sentido àquilo que a gente estava a creditando, da religiosidade
das mulheres negras que vieram pra cá. Possivelmente Dona Preta é descendente
dessas mulheres que ficavam perambulando por esse rio, depois que não eram
aceitas nem junto aos negros barbadianos ou na própria Ferrovia. Isso leva a
crê, é uma hipótese minha, que ali onde Dona Preta está situada (Conceição do
Galera no baixo Madeira) pode ser um foco fragmentado da presença dessas
mulheres. A gente até usa no espetáculo algumas frases que ela cedeu pra gente.
Ela fala assim: “Quando eu nasci, eu morri”.
Zk – Outra fonte?
Chicão Santos – Foi
justamente os cemitérios, onde descobrimos registros maravilhosos tanto da
presença árabe como de outras nacionalidades. Encontramos lápides escrita em
espanhol e até em hebraico. Chegamos a Nova Olinda e o secretário de cultura
todo empolgado, mostrou uma loja de artesanato dizendo, “isso é a coisa mais
preciosa que nós temos” e em cima de uma cadeira de plástico estava uma lápide
escrita em árabe. Aí dissemos pra ele: não secretário a coisa mais importante
que o senhor tem aqui é essa lápide. Eles tinham destruído todo o cemitério
árabe. Esses locais foram fundamentais na pesquisa. O interessante na pesquisa
foi que descobrimos o grande tesouro que existe ao longo desse rio, que é a
farinha.
Zk – A farinha?
Chicão Santos – Inclusive
quando chegamos num lugarejo depois de Caiçara encontramos um grupo de árabes e
eles sentados com a gente, pegavam um galho e desenhavam um círculo que tinha
todo um significado. Na cena do Varadouro a gente reproduz isso, fazendo o
círculo com a farinha. Engraçado como isso criou um fato importante, nos
debates tanto em São Luiz como em João Pessoa o pessoal pensava que era ouro e
agente explicava que, a farinha para o amazônida é o grande tesouro. O
Varadouro foi concebido a partir dessas condições estabelecidas e das pesquisas
realizadas nos museus em Manaus e no Rio de Janeiro e tem também a questão da
camelotogia.
Zk – O que é isso?
Chicão Santos – Descobrimos
que nos batelões, quando vinham de Belém pra cá, vinha fazendo o comércio de
troca e ali se estabelecia a camelotogia que nada-mais é do que querer ganhar o
outro no “grito”. Isso se estabeleceu nos barrancos, era batelões com casco de
ferro, o que dava sentido a vinda pra cá quando sabemos que o casco de ferro
aguenta maior impacto provocado pelos troncos que até hoje descem o Rio
Madeira.
Zk – Quantos trabalharam
nessa pesquisa?
Chicão Santos – Fizemos um
processo de investigação com várias frentes. Tinha um grupo no Rio de Janeiro e
outro grupo aqui em Rondônia eram em torno de 12a 15 pessoas. Depois fizemos
uma demonstração no Itaú Cultural com o resultado da pesquisa, inclusive foi
editado recentemente um livro e um DVD com todo esse relato. Pra gente foi
muito importante, porque foi a primeira vez que recebemos recurso pra fazer
pesquisa e com toda a liberdade, não tinha aquela coisa dura, grossa de estar
prestando conta. A prestação de conta era apresentar o resultado da pesquisa e
acabou.
Zk – Quem entra em cena?
Chicão Santos – Na verdade a
peça é um monólogo só que com a intervenção de uma dramaturgia sonora que é a
pesquisa que o Bira Lourenço vem fazendo com a gente também que a questão do
Barro da Corda. Em Filha da mata ele também fez um trabalho em cima de
elementos que compõem essa temática e no Varadouro ele coloca em cena também.
Então é o Léo Carnevalle do Rio de Janeiro como ator nós fizemos questão de
trazê-lo do Rio de Janeiro em função do Percival Farquar. Inclusive fomos muito
questionado: “Por que não colocam uma ator da Amazônia”, porque queríamos realmente
reproduzir a história.
Zk – Em 2014 o que o
Imaginário vai apresentar. O Encena na Rua esta confirmado?
Chicão Santos – 2014 pra tem
uma coisa muito importante, já conseguimos o prêmio para manter o nosso Tapiri
funcionando com trabalho de formação, montagem de outros espetáculos, a gente
tem uma pesquisa em andamento que está com dois anos que é sobre as Mulheres do
Aluá.
Zk – E o Amazônia Encena?
Chicão Santos – Passamos o
Amazônia Encena pro Sesc em função da demanda que cresceu muito e das linhas de
financiamento que a gente não encontra mais lugar pra financiar o Festival. No
Festival deste ano sofremos muito e assumimos um compromisso com o Sesc que
ajudou a gente e em 2014 assume a integralidade da realização do Festival Amazônia
Encena na Rua. Também tivemos dificuldade com a prefeitura.
Zk – Que dificuldade?
Chicão Santos – A prefeitura
de Porto Velho não quis conversa no que diz respeito a parceria e também
tivemos problemas no inicio deste ano , quando a Funcultural botou a polícia em
cima da gente, assim sendo a gente não vai estabelecer nenhuma relação de
trabalho com essa administração, enquanto eles não se retratarem publicamente,
No governo do estado temos dificuldade me conseguir recursos, não é só o teatro
mas, todos os segmentos. Esperávamos que em 2013 nosso sistema de cultura já
estivesse funcionando, o que possibilitaria que todos os segmentos
participassem dos Editais. Nosso Fundo de Cultura não funcionou.
Zk – A respeito do Fundo de
Cultura recentemente os deputados estaduais aprovaram o Projeto que diz que o
governo do estado de Rondônia poderá destinar ATÉ cinco centésimos por cento do
orçamento para o Fundo de Cultura. O que você acha da inclusão do termo Até?
Chicão Santos – Nosso Fundo
estava dentro do que estabelece o Ministério da Cultura, agora, na calada da
noite a pessoa alterar uma Lei que nem entrou em funcionamento, acho meio
estranho. Eles preferem construir presídios a investir em cultura. Nós estamos
chegando a um ponto, pelo não investimento na área social e na áreas cultural
de ficarmos cercados. Daqui um tempo vamos pegar as pessoas de bem, colocar
dentro dos presídios e soltar os que estão lá dentro. Esse negócio de colocarem
na Lei a palavra ATÉ foi uma falta de consideração muito grande e falta de
responsabilidade.
Zk – Par encerrar. Quem é
que faz parte do Grupo O Imaginário?
Chicão Santos – Temos o
pessoal que trabalha na Gestão que está em final de mandato, ano que vem tem
eleição, tem a Jessica, Sidney, Janderson; Na equipe de produção tem Eu, Zaine
Diniz, aí vem o pessoal das redes sociais, Bruna, Bethânia e os colaboradores e
os alunos aí vem os colaboradores na parte de formação que é o Marmude, Cláudio
Guedes, Bruno e o Alex. Na parte de formação vocal tem o Marquinho Grutzmacher;
William Bezerra que é professor nosso. Quando realizamos grandes eventos vem
todo mundo Braguinha que hoje está no Sesc mas começou aqui, a Cris, Andresa e
ainda temos os técnicos, seu Ozias na iluminação o Davi na sonoplastia e o
grande Ismael Barreto que é um monstro na cenografia.
Zk – Quem é o Chicão Santos?
Chicão Santos – é o
Francisco dos Santos Lima que nasceu em São Mateus (ES) e morou durante 25 anos
em Cacoal onde começou a fazer teatro em 1978 e está há 15 anos em Porto Velho.
Tem uma coisa muito importante>
Zk – Pode falar?
Chicão Santos – É essa coisa
do Santo! Eu não jogo a cachaça fora dou pro Santo. Porto Velho é uma grande
escola para todos nós. Aqui todo mundo tem espaço!
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