A importância da preservação dos quelônios
Entre os dias 12 e 15 deste mês,
aconteceu a subida de tartarugas e tracajás para a desova nas praias do Vale do
Guaporé. Este ano o superintendente do IBAMA em Rondônia, fez questão de
acompanhar o trabalho dos técnicos do órgão federal em parceria com a Ecovale
que tem o Zeca Lula como especialista no assunto preservação de quelônios. Além
do Carlinhos Paraguassau, o fotografo Rosinaldo Machado também participou da
ação cujo ápice, deve acontecer a partir do dia 4 de dezembro, quando acontece
o fenômeno da eclosão, que este ano, está estimado em mais de 2 milhões de
filhotes.
ENTREVISTA
Zk – Você é de onde?
Carlos Alberto – Nasci no distrito
do Iata em Guajará Mirim em 1960.
Zk – Vamos falar sobre a
desova das tartarugas e tracajás este ano no Vale do Guaporé?
Carlos Alberto – Esse é um
projeto que chamamos de Quelônios da Amazônia que vem desde a década de 1970 no
Vale do Guaporé. Antes do IBDF assumir, era um projeto que estava sob a
coordenação e execução da antiga secretaria de agricultura do ex território de
Rondônia. Hoje a responsabilidade da preservação das tartarugas e tracajás é do
IBAMA em parceria com a Ecovale.
Zk – Antigamente o reduto de
tartarugas e tracajás era nas praias do rio Madeira em especial na Praia do
Tamanduá. Alguns dizem que essas espécies foram levadas daqui, pro Vale do
Guaporé. É verdade?
Carlos Alberto – Isso é um
pouco de mito! Naturalmente o berço do projeto de preservação foi no Vale do
Guaporé, o povoamento. Na realidade toda extensão da bacia do Madeira possui
quelônios, em menor proporção.
Zk – Há alguns anos, mantive
contato com uma equipe de biólogas lá em Costa Marques que pertenciam ao Tamar.
Você sabe se aquelas biólogas trabalhavam para o IBDF ou IBAMA na época?
Carlos Alberto – Passaram
muitas pessoas por lá, por esse programa de preservação, porém, com todo o
cuidado que a gente tem do manejo que corresponde a proteção da desova, o
recolhimento desses ovos, a leva a um criadouro, até o processo de eclosão,
nascimento do filhote, até a soltura, demanda tempo, um período de
aproximadamente seis meses. Tivemos a felicidade de nos últimos tempos, termos
aqui, a presença marcante e decisiva da Ecovale que é uma Associação
Comunitária Quilombola do Vale do Guaporé hoje sob a presidência do nosso amigo
Jorge, mas, quem está a frente dos trabalhos de campo, que faz toda a
articulação política é o nosso amigo Zeca Lula. O trabalho que estamos fazendo
hoje, apesar de ter um programa nacional, é muito mais de fiscalização, que é
diferente de proteção. Pela extensão do Vale do Guaporé demandaria uma equipe
muito grande, tanto de servidores como pessoas treinadas pra fazer essa
proteção. É o que a Ecovale faz.
Zk – Vocês tem a estimativa
da população de quelônios atualmente no Vale do Guaporé?
Carlos Alberto – Pra se
fazer uma estimativa é preciso uma sequencia histórica. Por alguns anos, o
programa ficou um pouco debilitado, no sentido da proteção do poder público.
Com esse distanciamento das ações mais diretas, perdemos o fio da meada.
Retomamos a partir do ano passado com as ações mais efetivas com a presença do
IBAMA na fiscalização e com a legitimação e acompanhamento, supervisionamento
das ações da Ecovale, como também um trabalho que estamos desenvolvendo junto a
toda população do Vale no sentido de que cada morador, cada pessoa que visite o
Vale do Guaporé também seja um protetor dos quelônios. Posso dizer que com a
nossa presença no Vale do Guaporé, as ações da Ecovale passaram a ter o
respeito de todos aqueles que usam o Vale do Guaporé e que por ventura se
aventuram em cometer um crime ambiental.
Zk – Tem como estimar a
quantidade de tartarugas que desovaram este ano?
Carlos Alberto – Nosso
biólogo Alexandre pode responder com mais precisão por que ele acompanhou
melhor. Nossa presença foi apenas durante dois dias. A saída das tartarugas
para desova, também foi registrado pelas nossas imagens e pela contagem de
pesquisadores de diversas instituições que participam do programa que é também
de interesse científico. Este ano, pela proteção que houve com um trabalho
prévio de orientação e educação ambiental e da legitimação da Ecovale, foi o
ano que mais saiu tartaruga e tracajás para a desova.
NR – O fotografo Rosinaldo
Machado que acompanhou a desova, nos informou que os técnicos estimaram em
aproximadamente 30 mil tartarugas e tracajás que saíram para desovar em 2017.
Zk – Com esse recorde, dá
para estimar quantos filhotes vão eclodir?
Carlos Alberto – A eclosão
está prevista para começar lá pelo dia 4 de dezembro. É provável que o número
de filhotes ultrapasse os 2 Milhões, pois ainda há tartaruga desovando. Vale
salientar que nascem muitas mais tartarugas que tracajás.
Zk – Quais são os grandes
predadores?
Carlos Alberto – Temos
diversos predadores, tanto terrestres, como aéreos como os que estão na água.
Porém, o predador cruel é o ser humano, ele vai la e pega os primeiros ovos.
Zk – Existe uma previsão
para o consumo desses animais, ser liberado?
Carlos Alberto – Alguns
estados da federação têm criadores legalizados. Em Rondônia não temos nenhum
criador legalizado para comercializar nenhum tipo de espécie.
Zk – Existe a possibilidade
de se legalizar?
Carlos Alberto – Existe a
legislação própria pra isso, com todos os critérios, porém até hoje não
apareceu nenhum empreendedor disposto a cumprir todas as regras, aqui em
Rondônia.
Zk – Você falou em parceria
com os quilombolas. Não seria o caso de se preparar essas comunidades no
sentido atuarem como criador com direito a comercializar as espécies?
Carlos Alberto – Não se
aventou nenhuma possibilidade a respeito disso. Os quilombolas estão
desempenhando um papel importantíssimo, que é de preservação. Eles por ser
consumidor nato, pois, quelônio faz parte do cardápio da cultura dos
quilombolas do Vale do Guaporé, com o passar do tempo e com a agressividade da
exploração que ocorria, houve uma manifestação espontânea dessas pessoas que
vivem em condições de extrema precariedade em se organizar, para defender algo
que eles consideram integrante da natureza.
Zk – O Vale do Guaporé não é
apenas Brasil tem o lado boliviano. Eles os bolivianos também se preocupam com
a preservação das espécies?
Carlos Alberto – A Bolívia
hoje tem um programa levado muito mais a cabo que aqui no Brasil. No período da
soltura dos quelônios o Ministro do Meio Ambiente vem pessoalmente participar,
ou seja, eles estão muito bem estruturados no programa de preservação dos
quelônios do lado boliviano.
Zk – Por você ser um
rondoniense nato e da região de Guajará Mirim onde se consumia muita tartaruga
e tracaja. Qual o seu prato preferido. É a farofa do casco ou o sarapatel?
Carlos Alberto – Sorrindo...
Pois é, você sabe que a tartaruga e o tracajá foi cardápio. Inclusive é um
prato muito rico em proteínas e lipídios, fazia parte do cardápio das
populações mais antigas em épocas passadas. Era outra legislação, a população
se alimentava desses bichos silvestres sem grandes problemas, com o passar do
tempo as coisas foram mudando e a gente foi se adaptando a novos tempos. O
grande problema naquela época é que se capturavam as fêmeas quando elas saiam
pra desovar. Isso foi que levou a diminuição drástica da espécie.
Zk – Por que o Vale do
Guaporé foi escolhido para o desenvolvimento do programa de preservação de
quelônios?
Carlos Alberto – No caso do
Vale do Guaporé, por ser uma região mais afastada, menos ocupada humanamente
foi que se projetou um programa de preservação de quelônios naquela região que
hoje já sofre pressão muito grande. Os municípios estão crescendo, a população
tá chegando. Hoje o fluxo de turista é muito grande, principalmente nessa época
do ano. Aquilo é uma coisa muito bela.
Zk – Vamos tomar como
exemplo a eclosão deste ano que deve ultrapassar os 2 milhões de animais.
Quantos conseguem chegar à idade adulta?
Carlos Alberto – A taxa de
sobrevivência, vamos dizer que é 1 pra 10. É muito pouca. A tartaruguinha é
consumida tanto pelas aves, como pelos peixes. Isso faz parte da cadeia
natural. Esse é um processo que ocorre sem a intervenção do homem e tudo nesse
ciclo da vida, está no seu devido lugar.
Zk – Para encerrar. Como é
administrar o meio ambiente, principalmente na Amazônia?
Carlos Alberto – O IBAMA
aqui em Rondônia é uma superintendência e por força da própria Portaria que
normatiza as atribuições e o Regimento Interno do IBAMA, é muito clara em seu
artigo 122 que as superintendências estaduais compete tão somente a
coordenação, planejamento e operacionalização e execução das ações do IBAMA e a
supervisão técnica demandadas pelas diretorias. Hoje, pela portaria normativa
nº 14 de junho de 2017, com a descentralização do órgão, as superintendências que
é o nosso caso, ela se encolhe cada vez mais.
Para você ter uma idéia, hoje temos uma superintendencia em Porto Velho
e duas unidades técnicas para atender 52 municípios. Uma unidade em Vilhena e
outra em Ji Paraná. Temos setores que não têm funcionários. O órgão ta encolhendo
cada vez mais. Quase 50% dos servidores já estão recebendo abono permanência.
Eu não sou de reclamar porque isso é questão de gestão. Posso dizer que mesmo
com pouco orçamento não houve prejuízo das atividades que são da competência da
superintendência.
Zk – E o MAB de Jaci?
Carlos Alberto – Este ano já
fomos ocupados três vezes. Essa última, por mais que tenha sido agressiva do ponto
de vista do modus operandis como ocorreu, sentamos-nos à mesa de negociação
para tentar levar a cabo aquelas reivindicações pautadas pelo MAB e conseguimos
com muita conversa, muito dialogo e reais possibilidade de soluções de algumas
demandas fazer com que o MAB desocupasse nosso prédio. Isso precisa de muita
manobra, muito equilíbrio, muita conversa, tendo em vista que a
superintendência e a pessoa do superintendente chegou no limiar da sua
competência legal e ilegal de resolver as questões que estavam sendo
negociadas. Tudo que foi possível nós fizemos. É como diz o João Marcos um dos
lideres do Movimento: “Somente um sangue caboclo, um sangue de índio, um sangue
ribeirinho, muita traquilidade e muito diálogo consegue minimizar uma coisa que
estava a ponto de explodir”. É muito caldo de galinha, muita paciência, porque
a gente sabe que aquele momento de explosão passa. Essas demandas que existem
são decorrentes dos passiveis nos âmbitos sociais e ambientais das usinas,
tanto de Santo Antônio como de Jirau. Hoje temos o MAB, Jaci Paraná, Joana
D’arque e o MAB Jirau. É isso. Obrigado!
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