Santo
Antônio - A Cidade que não existe mais
O jornalista, escritor,
superintendente de turismo do estado de Rondônia Julio Olivar Benedito, vai
apresentar a sociedade portovelhense, um dos livros mais completos sobre a
história de Santo Antônio do Rio Madeira. “A Cidade que Não Existe Mais”.
Julio apesar de não ser historiador de formação acadêmica, da um banho de
história, de uma história jamais encontrada nos livros sobre a história
regional e em especial a de Rondônia. Santo Antônio sempre é lembrada nos
livros de historiadores especializados como uma cidade violenta e imunda, pois
todos se baseiam no famoso “relatório” escrito por Oswaldo Cruz quando esteve
por aqui contratado pela empresa de Percival Farquar. Olivar foi fundo na
pesquisa e nos mostra uma Santo Antonio cheia de vida social, urbana, inclusive
com clube recreativo, e mais que ativo na política mato-grossense. Santo
Antônio por muitos anos foi considerado o maior município do mundo, assim como
o maior produtor de borracha do planeta.
Tive a honra de ter acesso
ao livro, inclusive já o li todo. Posso afirmar que apesar do autor dizer, que
a linguagem utilizada em sua concepção é a jornalística, aconselho todos os
estudiosos da história de Rondônia e em especial a de Porto Velho, ler a
história da Cidade que Não Existe Mais. Pode não ser uma livro de história,
mas, é para historiador pesquisar.
ENTREVISTA
Zk – Você é de onde?
Júlio Olivar – Sou de Minas
uma cidadezinha chamada Poço Fundo que até hoje tem 15 mil habitantes e fica
quase na divisa com o estado de São Paulo. É um universo caipira de onde herdei
esse sotaque, esse jeito de ser e de ver o mundo. Nasci em 1973. Moro em Rondônia desde 1998.
Zk – Por que Rondônia?
Júlio Olivar – Vim pra
conhecer. Sempre nas férias eu saia para algum lugar do Brasil a grana era
curta e por isso viajava de ônibus e nisso de conhecer, passei por 18 estados.
Tinha férias que ia a três, quatro estados. Era uma faculdade informal que
fazia e nisso, conheci Vilhena e lá encontrei uma colônia de mineiros, uma
gente afinada com a minha cultura e me encantei com a cidade, tanto que em dez
dias já estava morando la. Estava com 24 anos de idade.
Zk – Fazendo o que?
Júlio Olivar – Na época já
militava na imprensa como jornalista autodidata. Trabalhei na Rede Amazônica,
Folha do Sul um semanário que considero o melhor tablóide do interior de
Rondônia, escrevi para vários sites enfim, vivi disso durante muito tempo, até
entrar na política. Eu morava em Vilhena faziam cinco anos e participei da
criação do PC-do-B. Fui candidato a vice prefeito isso em 2004 quando o
candidato foi o senador Chico Sartório. E em 2006 fui candidato a vice
governador na chapa da Fátima Cleide, foi a eleição que o PT teve a maior
votação (190 mil votos) no estado de Rondônia.
Zk – E esse envolvimento com
a literatura?
Júlio Olivar – No ano que
desembarquei em Rondônia 1998, Vilhena estava fazendo 21 anos de emancipação e
então fizemos a 1ª edição de um suplemento que circulou junto com a Folha do
Sul que se chamava “Vilhena 21”, um material que a gente fez em cima de
depoimentos de moradores antigos da cidade. Sempre tive esse ideal. Por onde
passo procuro revisitar a história. “A Cidade que Não Existe Mais” que conta a
história de Santo Antônio do rio Madeira que será lançado oficialmente no
próximo dia 28 deste mês, é o meu quinto livro, mas já tem outro na editora que
é a biografia do Vespasiano Ramos tido como precursor das letras no estado de
Rondônia e que está fazendo 100 anos da publicação do livro “Coisa Alguma”. Meu
primeiro livro foi “O Mistério do Cônsul” que sobre a história do primeiro
cônsul da Suécia/Noruega no Brasil. Junto com D. João VI em 1808 chegou o
primeiro cônsul radicado no Brasil Lourenço de Westin e ele está sepultado em
Poço Fundo. Depois publiquei “Ruas que Andei”; “O Notívago” primeiro e único
livro de poesia; “Caminhos de Rondon” e agora “A Cidade que não Existe Mais”.
Zk – Como nasceu o livro A
Cidade que não Existe Mais?
Júlio Olivar – Ha uma lacuna
na verdade, no entendimento dos próprios historiadores. Quando eles falam que a
Estrada de Ferro Madeira Mamoré é o inicio de tudo, sendo que a Madeira Mamoré
decorreu da existência de um povoado que existia desde o século XVII fundado
por Jesuítas que deu origem a cidade de Santo Antônio oficializada em 1912 e não
se falava nada sobre essa cidade é como se ela fosse sempre uma Vila de Porto
Velho quando na realidade, era uma cidade co promotoria, judiciário, executivo,
com jornal, com destacamento da Policia Militar, com cadeia pública enfim com
tudo que existe numa cidade. Os primeiros 08 apenados condenados em Rondônia
cumpriram pena em Santo Antônio. O famoso navio Satélite que tem um link com a
história nacional. O primeiro livro publicado sobre turismo no Brasil foi
escrito por Mário de Andrade por conta de uma experiência que ele viveu no
município de Santo Antônio. É bom que se diga que a Estrada de Ferro Madeira
Mamoré percorria apenas 7 km em solo amazonense que era o trecho Porto
Velho/Santo Antônio e dali pra frente era tudo Mato Grosso (359 km) e Santo
Antonio só deixou de pertencer a Mato Grosso quando da criação do Território
Federal em 1943. Então Santo Antônio é o embrião de Rondônia e não a Estrada de
Ferro. A Mesa de Renda justificava como sendo Santo Antonio o maior município
do mundo, logo era o maior produtor de látex do planeta. A área territorial de
Santo Antônio (mais de 300 mil quilômetros quadrados) era quase o dobro da
Itália por exemplo.
Zk – Quanto durou a pesquisa
que resultou na publicação do livro?
Júlio Olivar – Foram dois
anos. O instituto de Memória da Assembléia Legislativa de Mato Grosso tem muita
coisa sobre Santo Antônio porque tinha deputado estadual eleito por Santo Antônio.
José Adolfo que ergueu o obelisco em comemoração ao Centenário da Independência
do Brasil em 1922 que existe até hoje, foi deputado estadual. Joaquim Tanajura
era vinculado diretamente ao governador Costa Marques por quem foi nomeado
prefeito de Santo Antônio. Encontrei muitos jornais que falam do cotidiano, das
brigas políticas que existiam em Santo Antônio entre o Parido Conservador e o
Republicano. Santo Antônio não foi só o embrião físico de Porto Velho. Tudo que
se tem em Porto Velho como a Maçonaria nasceu em Santo Antônio no Distrito de
Jacy Paraná, o jornal Alto Madeira teve como embrião o jornal Extremo Norte que
era do Tanajura que foi o primeiro jornalista atuante, primeiro médico fora do
mundo da EFMM. O primeiro advogado que atuou nessa região Manoel Amaro;
Raimundo Cantuária que era capitalistas um dos homens mais ricos da região
morava em Santo Antônio, o cunhado dele que era o Aureliano Borges era dono do
seringal Canaã que deu origem a Vila dos Papagaios que hoje é a cidade de
Ariquemes, onde Rondon se hospedava e criou um posto da linha telegráfico.
Forte Príncipe da Beira era Distrito de Santo Antônio. Os maiores seringais do
planeta eram localizados no município de Santo Antônio.
Zk – Os seringalistas
bolivianos também são destaque em algum trecho do livro?
Júlio Olivar – Nicolás Suarez
– El Bigodon juntamente com seu irmão vieram e se radicaram no que hoje
chamamos de “Casarão dos Ingleses”. Nicolas Soares participou ativamente do
conflito entre Acre e Bolívia. Existe na Bolívia um Departamento com seu nome,
ele foi o “Rei da Goma” era um dos homens mais ricos do mundo, ele foi
acionista da EFMM. Lembrando que o conflito Acre x Bolívia culminou com a
assinatura do Tratado de Petrópolis que fala em Santo Antonio como ponto
inicial da Estrada Ferro Madeira Mamoré até porque Porto Velho não existia. Na
época que a EFMM começou em Porto Velho todos os jornais se referiam apenas a
Rio Madeira, os cartões de visita que tenho cópias de alguns, também se
referiam a Rio Madeira e não a Porto Velho inclusive jornais que circulavam em
inglês ou era alto Madeira ou Rio madeira
Zk – Por que chamam de
Casarão dos Ingleses?
Júlio Olivar – Porque
realmente alguns ingleses moraram lá. Aquele local já foi muita coisa
Mercearia, Estação da Estrada de Ferro, Posto Telefônico. Esse termo “Casarão
dos Ingleses” é uma coisa recente. Eu tenho a planta da edificação e nada
consta sobre essa denominação.
Zk – Os historiadores só
falam sobre o famoso relatório de Oswaldo Cruz que diz horrores sobre Santo
Antônio, porém no seu livro a gente encontra uma outra visão. Como era a vida
social na cidade à época?
Júlio Olivar – Tinha banda
de música, clube recreativo, o Joaquim Augusto Tanajura que foi o primeiro
prefeito era boêmio, inclusive seus adversários políticos diziam que ele era
chegado ao “copo” a boa mesa, ele tinha mordomo. A primeira escola instalada em
Rondônia foi em 1914 em Santo Antônio. Falando em Tanajura ele era muito
intrépido com os adversários ele mandava bater literalmente, existem diversos
registros policiais que hoje fazem parte do arquivo do Tribunal de Justiça dói
estado de Rondônia dando conta de um perfil bastante truculento do Tanajura.
Ele chamava os adversários de “perrengues” como foi o caso de Vulpiano Machado
o primeiro Promotor de Justiça que atuou em Santo Antônio que tomou posse no
mesmo dia da posse de Tanajura como prefeito em 1912. Entre o afrontamento
político entre os dois houve a morte de um soldado esse caso de verdadeiro bang
bang está no livro.
Zk – Existia rivalidade
entre o Amazonas e Mato Grosso?
Júlio Olivar – Existia.
Manaus era a capital de tudo, por exemplo: a prelazia que atendia Santo Antônio
era de Humaitá até porque a viagem à Manaus era feita em seis/sete dias e pra
ir a capital de Mato Grosso Cuiabá se levava 72 dias porque tinha primeiro que
chegar a Vila Bela da Santíssima Trindade de barco e depois no lombo de mulas
até Cuiabá. A influencia da cultura dos português que vinham de Belém e Manaus
era muito intensa enquanto que Joaquim Tanajura por ser maçom utilizava a
igreja para as reuniões da maçonaria. Em 1922 o padre chegou de Humaitá para
rezar a missa e encontrou uma verdadeira festa dentro da igreja com banda de
música e tudo mais era festa da maçonaria, inclusive havia tido um baile na
noite anterior. O padre excomungou a localidade e foi embora, dizendo que não
voltava mais. Essa história está no livro de tombo da igreja católica.
Zk – Vamos parar de falar
sobre o que consta do livro se não o povo não vai comprar. Quando será o
lançamento?
Júlio Olivar – Vai ser no
dia 28 deste mês de julho na Biblioteca Francisco Meirelles.
Zk – Agora vamos falar da
sua função como superintendente de Turismo do Estado de Rondônia. Ultimamente
você tem desabafado sobre a falta de apoio ao setor. Por exemplo, ninguém
relaciona o Memorial Rondon que esta instalado justamente em Santo Antônio com
a SETUR Por quê?
Júlio Olivar – Esses dias
estava assistindo um comercial na Televisão a Usina dizendo que p Memorial foi
feito em parceria com o exército e a Universidade Federal – Unir. Eu queria
saber qual o papel da Unir naquele espaço. O museu foi feito com recursos de
compensação da Usina destinado ao estado e ao município, foram 3 Milhões
empregados e depois ainda houve um aditivo no valor de 400 Mil através de uma emenda
coletiva dos deputados estaduais para compra do acervo. Portanto não tem nada
com Universidade Federal. Quem mantém aquele espaço é a SETUR em parceria com o
exército. O próprio general já me procurou porque a Unir nunca pagou sequer uma
conta de energia elétrica. Estamos fazendo um trabalho de reconhecimento de
dívidas para pagar as contas atrasadas e assumir pra Setur o desafio que
consiste em manter o espaço aberto condizente com aquilo que foi pactuado com a
Usina que é manter a limpeza mais a vigilância por dois anos e nós assumirmos
sua administração porque se trata de um espaço cultural, político; faz parte do
Marco Zero da cidade. Tem no Sítio Arqueológico Vila de Santo Antônio uma
extensão da própria Estrada de Ferro Madeira Mamoré. A Estrada de Ferro
propriamente dita é da prefeitura de Porto Velho ainda assim a gente tem feito
intervenções pontuais, brigado para que eles também nos inclua na agenda da
EFMM que acho que é uma iconografia importante pra trabalhar a questão do
atrativo turístico, só que, de direito não temos obrigação para com a Madeira
Mamoré porque a concessionária é a prefeitura.
Zk – E o prédio do Relógio?
Júlio Olivar – O prédio do
Relógio que também faz parte da área do entorno pela catalogação do IPHAN a
gente tem como objetivo montar o Memorial de Porto Velho. Porque Porto Velho em
sendo uma capital diferenciada de todas as outras porque faz divisa com outro
país, com uma dimensão territorial maior que muitos estados não ter um memorial
sobre sua história é algo descabido. No prédio do Relógio que é grande temos
como meta criar o Memorial de Porto Velho. Na prefeitura de Porto Velho não
existe uma galeria de ex prefeitos. A grande pegada de Porto Velho é trabalhar
sua imagem enquanto município tradicional, porque é o único município de
Rondônia que tem mais de cem anos que tem ainda preservada algumas arquiteturas
de seus casarios. Nós a Setur brigamos pela preservação da casa dos Resks que
ia ser demolida. Brigamos judicialmente para que isso não acontecesse. Tem
muitas coisas que a gente tem feito sem propalar muito na mídia. É bom que se
diga com um orçamento pífio com pouca
gente trabalhando. Quando faço esses desabafos faço rifando minha própria
cadeira. Não quero fazer da Setur um cabide de emprego, quero trabalhar, quero
destravar o turismo, fazer as coisas avançarem, mas, preciso de ajuda.
Zk – Não seria ideal se
eventos como o Arraial Flor do Maracujá em Porto Velho e o Festival Duelo na
Fronteira de Guajará passasse a ser da alçada da Setur?
Júlio Olivar – Estive quarta
feira com o superintendente da Sejucel o Ilmar Esteves que me parece uma pessoa
muito bem escolhida pelo governador porque é nascido aqui, conhece de memória e
é uma pessoa ilibada, idealista. Vamos fazer alguns termos de cooperação que
não implica só a questão cultural, por exemplo: Porto Velho é a única capital
brasileira que tem a pesca esportiva como atrativo turístico e como a Sejucel
atua na cultura e no esporte vamos fazer alguns eventos relacionados a pesca
esportiva. Na questão da cultura, informalmente a gente já atua junto veja:
Enquanto que em Guajará ele promove a festa propriamente dita, nos entramos com
a infra-estrutura porque os barracões dos dois bois que demos a ordem de serviço
há duas semanas uma negócio que vai ficar em torno de 3 Milhões é da esfera da
Setur. Então, estamos trabalhando na questão da infra-estrutura e promoção do
destino turístico Guajará e ele na promoção da festa.
Zk – E o Arraial Flor do
Maracujá?
Júlio Olivar – O Flor do
Maracujá tem quase 700 Mil de recursos do estado e a Setur tenta transferir
desde o começo como promoção do evento como sendo turístico e não consegue,
porque está nas mãos de uma federação que faz a captação do recurso, faz a
festa a festa e a festa termina assim mesmo. Nós do turismo, por exemplo,
diferentemente da cultura, não fazemos o evento pelo evento. A cultura promove
o livre evento, todo mundo vai se diverte e vai embora. Nós do turismo temos
que mensurar o depois. Subiu enquanto o índice de ocupação do setor hoteleiro
em decorrência de uma festa? Se não subiu nada aquele evento não é turístico. O
Flor do Maracujá, por exemplo, tem uma importância na cultura de Porto Velho
mais não faz crescer o movimento na cadeia hoteleira no município de Porto
Velho, agora, há um potencial pra ser trabalhado no viés da comunicação da
promoção. O Flor do Maracujá precisa ser vendido primeiramente internamente, ou
seja, no estado de Rondônia, Tem que ser divulgado lá em Vilhena e nos demais
municípios. O Flor do Maracujá hoje é só Porto Velho o que é um equivoco porque
é uma festa de um brilhantismo tal que podia ser vendida internacionalmente por
todas suas particularidades, pela sua beleza cênica. Temos que trabalhar a
questão da promoção porque investimento já há do estado.
Zk – Como está o andamento
do Museu de Gente?
Júlio Olivar – O Museu de
Gente é uma idéia excelente do ponto de vista institucional porque nunca se fez
algo no sentido de coletar depoimento das pessoas pra que elas reflitam e
expressem a sua verdade, não é a história, mas, um ponto de vista dos atores
dessa história. A dona Maria de Nazaré Silva que é uma militante da cultura, já
coletou aqui em Porto Velho 40 depoimentos e no interior 35. Vamos criar um
portal pra disponibilizar esses audiovisuais. Vai ser uma fonte de informação
tal qual a existe em São Paulo no museu da imagem e do som ou no museu da
pessoa que tem a mesma filosofia nossa. Vai servir de fonte de pesquisa de
futuros trabalhos de ordem acadêmica.
Zk – Vamos encerrar falando
sobre o lançamento do livro “A Cidade que Não Existe Mais”?
Júlio Olivar – Vai ser no
dia 28 deste mês de julho às 19 horas na Biblioteca Francisco Meirelles.
Teremos apresentação da orquestra da faculdade Fimca/Metropolitana agradeço ao
Dr. Aparício Carvalho e a professora Lucineide Monteiro coordenadora do curso
de música. Vai ser uma bela oportunidade para a gente falar da história de
Porto Velho e de Rondônia. O livro apesar de não ser historiador, mas diria que
é uma reportagem com olhar historiográfico. A linguagem que emprego é
jornalista. Escrevi um livro apenas com o interesse que as pessoas conheçam
essa história que jamais foi tratada em nenhum livro de história regional. Tem
como objetivo não deixar esquecida a história de Santo Antônio do rio Madeira.
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