Dona Zezé viúva do Raimundo
Rola
O amigo Ivo Feitosa
recomendou via mensagem de celular o seguinte: Silvio você precisa conversar
com a dona Zezé viúva daquele barbeiro da 7 de Setembro o Raimundo. Sexta feira
passada dia 26, estava eu e a fotografa Ana Célia batendo na porta da
residência da dona Zezé no bairro Olaria perto da igreja de Nossa Senhora do
Rosário e fomos recebidos com sorrisos e abraços, parecia que éramos conhecidos
de muito tempo, a simpatia da dona Zezé cativa qualquer um. A conversa fluiu
naturalmente assim como as recordações da Porto Velho dos anos 1950 em diante. “Fomos
dos primeiros moradores da Baixa da União e lá ficamos até o 5º BEC chegar”.
Dona Zezé católica praticante frequentadora da Igreja do Rosário onde faz parte
de várias irmandades. “Sou Ministra da Eucaristia”. Histórias do seu marido
Raimundo Rola o barbeiro da Sete de Setembro. “Hoje a barbearia esta sob a
responsabilidade do nosso filho Jadernizio também conhecido como Alemão”, assim
como lembranças do tempo que as mulheres do Olaria se encontravam na
cachoeirinha que ficou conhecida como “Pedrinhas” para lavar roupa, você fica
sabendo a partir de agora.
ENTREVISTA
Zk – Vamos começar pela sua
identificação?
Dona Zezé – Meu nome é
Antonia Colares da Rocha nasci em 1944 em Manicoré Amazonas. Em 1957/58 vim a
Porto Velho passei uns meses, voltei a Manicoré me casei e vim embora de novo
pra cá e aqui estou até hoje.
Zk – Como começou sua
história com o Raimundo Barbeiro?
Dona Zezé – A gente era
vizinho e desde criança existia aquela atração um pelo outro e em conseqüência
o namoro começou muito cedo, tanto, que quando nos casamos, ele tinha 18 e eu
15 anos de idade e então viemos morar em Porto Velho. Acontece que ele era
barbeiro e lá em Manicoré não tinha muito serviço nessa área e o irmão dele Clésio
que também era barbeiro e já morava aqui o convidou e nós viemos pra cá. Nossa
primeira residência em Porto Velho foi na rua Prudente de Moraes no bairro do
Areal.
Zk – Aonde foi a primeira
barbearia do Raimundo?
Dona Zezé – O nome dele é
Raimundo Miranda da Rocha mais os amigos chamavam “Raimundo da Rola”. A
primeira barbearia foi no prédio do seu João Elias perto do Café Santos, depois
foi para o Bar Plaza que era da Deijoca do Expedito e ficava em frente à praça
Marechal Rondon onde ficou por sete anos, só então, foi para a Sete de Setembro
onde até hoje funciona, agora sob o comando no nosso filho Jadernizio o Alemão.
Ele passava a maior parte do tempo na barbearia e eu em casa cuidando dos
nossos filhos. São Sete homens e Uma mulher, ta tudo vivo e graças a Deus bem
encaminhados na vida. Francilmar, Jader James, Jadernira, Jadson, Jaderlandio,
Jaderlan, Jadernizio e o Jaderley.
Zk – Antes de fixar
residência no bairro da Olaria vocês moraram em quais bairros de Porto Velho?
Dona Zezé – Depois da Prudente
fomos para a rua D. João Batista Costa também no Areal de lá fomos para a Baixa
da União até quando veio do 5º BEC e tirou o povo de lá.
Zk – Pelo que sei o 5º BEC
levou o povo da Baixa da União para o bairro Liberdade e como foi que vocês
vieram para o bairro da Olaria?
Dona Zezé – Nós também
ganhamos um pedaço de terra no bairro Liberdade só que lá, a gente não podia
fazer nada sem o consentimento do 5º BEC, foi então que o Raimundo disse Zezé
isso não ta certo não, vou comprar um terreno fora daqui e construir nossa
casa, não sou soldado para viver sob ordens de militares. Compramos esse
terreno aqui no Olaria e construímos nossa casa. Naquela época aqui onde moro
até hoje, não tinha rua não tinha nada, era tudo sítio, a rua terminava na
igrejinha do Rosário, aliás, aqui era mais conhecido como bairro do Rosário.
Zk – Por falar nisso, vamos
lembrar da Porto Velho de quando a senhora chegou em 1958?
Dona Zezé – A cidade
terminava ali na igrejinha de Nossa Senhora das Graças assim mesmo, pra gente
chegar lá, era só por caminho não tinha rua aberta. Naquela área a gente ia
buscar tucumã, tinha muita goiaba araçá. Aqui no Olaria que não era nem
considerado bairro o pessoal vinha caçar, as mulheres lavavam roupa na “cachoeira”
que era um poço que originou o nome de “Pedrinhas”, aqui também tinha muita
goiaba araçá e murici.
Zk – A senhora chegou a
lavar roupa nas Pedrinhas?
Dona Zezé – Lavei muita
roupa lá, a mulherada dessa área e até de outros cantos, vinha lavar roupa e a
gente passava o tempo fofocando sobre as coisas da cidade, principalmente sobre
a vida dos “categas”. Tinha o campo de aviação onde ficava o aeroporto do
Caiari. O primeiro carro que entrou nessa área do Olaria ou Pedrinhas foi o
carro que veio trazer a bagagem da nossa mudança.
Zk – E o Raimundo era
festeiro, boêmio?
Dona Zezé – Ah maninho, era
muito sem vergonha, nossa Mãe! Quantas e quantas vezes ele chegou em casa
bêbado e eu o expulsava. Vai pra Baixa da Égua com essa bebida rapaz. Tem uma
história das bebedeiras dele que ficou famosa.
Zk – Vamos contá-la?
Dona Zezé – Inclusive essa
história foi contada várias vezes num programa de rádio que ele participava.
Foi assim: Ele saiu da barbearia direto para uma festa e de manhã foi direto
pra feira comprou um tambaqui, naquele tempo tambaqui era de no mínimo dez
quilos, só que em vez de vir pra casa continuou bebendo com os amigos, ele
chegou em casa num carro da polícia e queria que eu assasse aquele peixe que já
estava inchado e fedendo de podre. ”Assa esse tambaqui na folha da bananeira
Zezé”. Isso virou piada e era constantemente contada no programa da rádio e na
barbearia como “História de Pescador”.
Zk – Quais as festas que ele
gostava de ir?
Dona Zezé – A festa dele era
nos puteiros que naquele tempo era tudo ali pela D, Pedro, Joaquim Nabuco,
Afonso Pena chamavam de Mãe Preta, Tambaqui de Ouro, Tartaruga, Anita, Maria
Eunice era nessas casas a festa que ele ia. Depois que ficamos velho a gente ia
muito às festas juntos e era de bicicleta. Festa no Funrural, Januário e outros
forrós. Posso dizer que o Raimundo curtiu a vida.
Zk – E o ciúme?
Dona Zezé – Manozinho te
juro que eu fazia promessa, quantas vezes me ajoelhei pedindo a Deus e a Nossa
Senhora pra ele parar de beber eu tinha raiva da cachaça, mas ciúme por causa
de mulher não tinha não, nunca brigamos por causa disso. O bom era que quando
ele chegava das festas já vinha com o mercado feito, era peixe, era carne ele
sabia as coisas que eu gostava e trazia tudo. Dia de domingo a nossa casa era
cheia e a mesa era farta, tinha de tudo, peixe, porco, boi, galinha era tanta
comida que às vezes eu esquecia de almoçar, de tanto ficar provando na hora de
fazer. Quando vejo esse cantor de samba Zeca Pagodinho naqueles encontros com
os amigos dele em Xerem me lembro dos domingos no tempo que o Raimundo era vivo
e boêmio. Era trabalhoso mais era bom!
Zk – Por falar em fartura
teve um tempo que era difícil se conseguir carne de boi em Porto Velho. Lembra?
Dona Zezé – Naquela época a
carne vinha de avião de Cuiabá e tinha a famosa fila da carne. Tinha que ir de
madrugada pra fila da carne do mercado municipal e muitas vezes, quando a
pessoa conseguia chegar perto da banca do açougueiro a carne acabava. O
Raimundo sempre conseguia porque ele tinha muitos amigos açougueiros, aliás,
ele sempre foi considerado e sua barbearia sempre foi referencia como ponto de
encontro dos contadores de causos e outros mentirosos como ele mesmo dizia.
Zk – Tem uma história da
barbearia sobre a política. Qual é?
Dona Zezé – Todo ano que
tinha campanha política, ele pegava os santinhos dos políticos e selecionava
alguns para a galeria que ele denominou de “Cantinho dos Indesejáveis” e as
fotos eram pregadas em papel higiênico. Até hoje ta lá na barbearia o famoso
chifre e o vaso sanitário. A barbearia fica na Sete de Setembro sub esquina com
a Gonçalves Dias.
Zk – Ele morreu de que?
Dona Zezé – De diabetes! Na
realidade foi conseqüência de uma malária mal curada que ele achou de fazer
tratamento na Bolívia. Colega, ele cansou de curar as pessoas de malária
receitando o sumo do Melão Caetano, era malária e pneumonia. Quantas vezes foi
procurado para aplicar injeção, preparar um chá e tantos outros remédios pras
pessoas, ele era bom demais e morreu em conseqüência de uma malária mal curada
misturada com o diabetes.
Zk – O que notei foi que a
senhora é conhecida como Zezé, mas, o seu nome não tem nada a ver com a
apelido. Por que Zezé?
Dona Zezé – Acontece que meu
nome era pra ser Euzerina ou Maria José, mas, em virtude de uma promessa que
mamãe fez pra Santo Antonio terminei sendo batizada como Antônia, porém, desde
criancinha sou chamada de Zezé.
Zk – Vamos encerrar nossa
conversa com sua mensagem de final de ano e mãe experiente?
Dona Zezé – Olha, um dia Dom
Moacir Grechi veio almoçar aqui em casa e na conversa, perguntou como eu havia
criado meus filhos. Apontei pro pé de cuia que até hoje existe no quintal e
falei: Dom Moacir aquela cuieira enquanto eu viver ela vai ficar ali, pois foi
ela que me ajudou a educar meus filhos, hoje todos são bem encaminhados, nenhum
deles seguiu o mau caminho. Sei que existe uma Lei que proíbe os pais de bater
nos filhos, mas, uma coisa é certa: Quem não faz seu filho chorar enquanto criança/adolescente,
um dia pode chorar por ele! Aproveito a oportunidade para desejar a todos os
amigos e conhecidos um Ano Novo cheio de saúde e paz!
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