O
Jornalista que denunciou o Genocídio do Madeira
Durante a 3ª Rondônia Rural Show que aconteceu em Ji Paraná entre os
dias 21 e 24. Viajamos juntos, cumprindo pauta do Decom, com o
jornalista/radialista e escritor Zé Luiz, durante a viagem conhecemos a
história vivida pelo colega durante o Regime Militar. “Fui preso, torturado e terminei
sendo mandado para o Chile na mesma época que foram o Gabeira, Fernando
Henrique Cardoso, José Serra e outros exilados políticos”. Após retornar
ao Brasil e já contratado pela revisa Veja cumpriu pauta em 1976 no Território
de Rondônia no Distrito de Espigão D’Oeste sobre o abandono dos índios Suruís
pela FUNAI, a matéria foi censurada porque a Veja colocou a foto dos índios em
volta do fusquinha que me transportou até a aldeia, com a seguinte legenda: “Aonde
a FUNAI não chega de helicóptero, o repórter de Veja chega de fusca”. Essa
é apenas uma das muitas histórias desse jornalista, que durante a 3ª Rondônia
Rural, deu um show de cobertura, entrevistando ao vivo, governador, senadores, ministros
deputados, e produtores rurais, para a Rádio Globo Rondônia (1.310).
Quer saber mais, acompanha a
entrevista do autor dos livros: “Memórias Torturadas”; “Brasiguaios Destino
Incerto” e “Genocídio do Madeira”, nosso colega jornalista Zé Luiz
ENTREVISTA
Zk – Qual seu nome completo?
Zé Luiz – Sou José Luiz
Alves estou com 65 anos de idade, nasci em Dilermando de Aguiar sul do Rio
Grande do Sul quase na fronteira com a Argentina.
Zk – Na área da comunicação
o senhor começou quando?
Zé Luiz – Comecei como
entregador de jornal no Correio do Povo de Porto Alegre da Companhia
Jornalística Caldas Júnior em 1962, fiz um curso à época no Colégio Rosário que
hoje seria a faculdade de jornalismo. A partir daí comecei a trabalhar como
fotógrafo, ganhei prêmios e passei a produzir textos também, fui me entrosando
no meio jornalístico e hoje estou em Rondônia.
Zk – Como foi que o senhor
foi parar na assessoria de comunicação do Senado Federal?
Zé Luiz – Com 20 anos de
idade, fiz concurso para revisor do Senado Federal, isso em 1969 e assumi em 1970.
Antes disso, tinha certa militância política, mantinha contato com o Senador
Pedro Simon na época deputado estadual líder do MDB. Minha ficha de filiação no
MDB era a nº 3 pela juventude do partido naquele tempo, liderada pelo então
deputado Pedro Simon que trabalhava com o Arcebispo do Rio Grande do Sul Dom
Ivo Lorcheiter em defesa dos direitos humanos. Quando assumi no Senado, naquele
tempo não havia Internet não havia essa parafernália eletrônica que existe
hoje, assumi com um bom salário, fazia free lance para o jornal Estado de São
Paulo em Brasília, até que em determinado dia, quando saia do Senado por volta
da meia noite, fui preso por um grupo de militares a paisana com metralhadoras,
fuzis, me colocaram de bruços numa camioneta tipo Veraneio e me levaram para
uma prisão onde estavam outros presos políticos.
Zk – O senhor foi torturado?
Zé Luiz – Fiquei preso
durante 73 dias, fui torturado, levei choque elétrico, levei muito telefone
(tapa simultâneo nos dois ouvidos), até hoje guardo algumas sequelas. Eles queriam saber qual o meu relacionamento
com o deputado Pedro Simon e com o MDB, mas, não tinha nenhuma acusação formal,
até porque eu não tinha participação direta no processo político, tinha como
jornalista.
Zk – Como o senhor conseguiu
a liberdade?
Zé Luiz – Quando saí da
prisão pedi asilo político na
Embaixada do Chile e passei a viver sobre a proteção da bandeira chilena. Minha
mulher Maria Helena Dorneles da Silva e nosso casal de filhos foi para o Sul.
Dali a uns cinco dias, fui colocado num avião e fui levado para o Chile com um salvo
conduto. Com esse documento eu podia transitar pelo país, só não podia exercer
minha profissão de jornalista. Trabalhei como ajudante de cozinheiro, enfim,
fiz vários outros trabalhos pra sobreviver.
Zk – É verdade que o senhor
foi junto com o pessoal exilado para o Chile em troca da libertação daquele
embaixador americano que havia sido sequestrado pelo movimento anti-revolução
militar?
Zé Luiz - Na época aconteceu
o sequestro do embaixador americano Hulbrych e foi preso o Fernando Gabeira e
mais um bocado de gente, o pessoal da revolução achava que eu tinha ligação com
aquele povo que havia sequestrado o embaixador e eu não tinha nada a ver com
aquilo. Nessa leva foi também o Fernando Henrique Cardoso professor, sociólogo,
Fernando Gabeira e o José Serra, é claro que em outro avião, no Chile a gente
se cruzava. Com o salvo conduto podia inclusive me deslocar por outros países
como a Bolívia, Argentina, Uruguai enfim, toda a América Latina que naquela
época, vivia sob o regime ditatorial, com aquele salvo conduto eu podia transitar
nesses países. Assim vivi do começo de 1971 até maio de 1974.
Zk - Como foi o retorno para
o Brasil?
Zé
Luiz – O retorno foi via Santa Cruz de La Sierra – Bolívia, onde peguei um trem
e desembarquei em Corumbá (MS), era o dia 15 de maio de 1974 só com a roupa do
corpo e 25 pesos bolivianos no bolso.
Zk –
Já podia retornar ao Brasil sem problemas?
Zé
Luiz – Não teve problema porque o Brasil já estava vivendo o processo da
abertura lenta e gradual, pregada pelo presidente Geisel. Cheguei e fiquei uns
três dias me recompondo, estava com 25/26 anos de idade, depois peguei o trem e
fui até Campo Grande de onde fiz uma ligação a cobrar para a redação da revista
Veja. A telefonista atendeu e eu disse, quero falar como editor executivo Paulo
Totti (que hoje está com noventa e tantos anos e está no jornal Valor Econômico).
Liguei porque ele me conhecia lá do Rio Grande do Sul. Quando ele atendeu
disse: Paulo é o Zé Luiz teu aluno e ele respondeu “O animal tu ainda está
vivo?”. Contei minha história pra ele e disse que estava desempregado e
precisava de dinheiro. Então ele perguntou se tinha banco Itaú e mandou que eu
fosse para agencia, que iria mandar dinheiro e uma passagem de ida e volta a
São Paulo e pedi, Totti gostaria, já que você está me ajudando, que essa
passagem fosse também por Porto Alegre, pois preciso ver minha mulher e meus
filhos que faz quatro anos que não os vejo. As cartas que trocava com minha
mulher eram censuradas. Para encurtar a conversa, fui pro banco com uma roupa
toda poída. A atendente me olhou de cima abaixo desconfiada, pegou minha
identidade e foi verificar se tinha alguma ordem de pagamento pra mim, quando
ela voltou com aquela tirinha de papel que era a ordem de pagamento no meu
nome, já me chamou de senhor, porque o depósito era muito bom, 20 Mil (dinheiro
daquela época) era muito dinheiro. Pra quem estava vivendo quase que a pão e
água. Comprei roupa, terno fui prum hotel melhor pois estava numa pensão, fui à
Vasp comprei passagem de ida e volta a Porto Alegre com passagem por São Paulo.
Quero confessar aqui, foi uma das maiores emoções que tive na vida, não de ver
minha mulher e meus filhos, foi quando desembarquei no aeroporto Salgado Filho,
tive vontade de me ajoelhar e beijar o solo daquele Estado e gritar, seus
desgraçados, estou de volta!
Zk –
E o contrato com a revista Veja?
Zé
Luiz – Fui contratado como corespondente em Mato Grosso cobrindo, Paraguai,
Bolívia e com a missão de cobrir o processo de divisão do Estado que estava
prestes a acontecer. A partir daí, fiquei sete anos na Veja, o Estado foi
dividido e eu quis sair de Cuiabá. Deixei a Veja, fui pra Campo Grande ser correspondente
do Jornal do Brasil do Rio de Janeiro. Em Mato Grosso do Sul encontrei o
advogado Wilson Barbosa Martins que passou a me chamar de velho companheiro,
porque ele também tinha sido vítima do golpe militar. Nesse meio tempo, ele
saiu candidato a governador e eu fui assessor de imprensa na campanha dele e
ele foi o 1º governador eleito de Mato Grosso do Sul.
ZK –
E a campanha do Fernando Henrique?
Zé
Luiz – Aí já chegamos à eleição de 1990. Antes tinha feito uns free lance pro Mário
Covas. Aí o Collor foi eleito e eu ganhei uma bolsa de estudo para fazer um
curso como aluno visitante na UCDB em Brasília e veio o processo de impeachment
do Collor e então fui trabalhar como correspondente em Brasília da Rádio Guaíba que é do Grupo Caldas Júnior, cobrindo
o impeachment do Collor. Foi uma experiência fantástica, o que era noticia
agora, daqui a alguns segundos não era mais importante. Aquele mundo político
de Brasília foi a maior experiência jornalística. Aí assumiu o Itamar Franco e
fui trabalhar como assessor de imprensa do ministro Sinval Guazelli da
Agricultura, o governo do Itamar Franco era mandato tampão, foi quando foi
criado Plano Real e veio a eleição de Fernando Henrique Cardoso e eu fui
convidado pelo então deputado Saulo Queiroz do PSDB juntamente com mais 126
jornalistas de todo o país. Com o Saulo Queiroz, Ana Tavares e com o Sergio
Mota fui escalado para trabalhar na campanha do Fernando Henrique nos estados
de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Norte do Paraná. Fernando Henrique foi eleito
e todos os jornalistas aproveitados de uma maneira ou de outra. Fui indicado
para ser Coordenador de Comunicação Social do INCRA, mas, foi uma experiência
muito rápida. Foi então que encontrei o ex-preso político Nurembergue Borges de
Brito que era engenheiro e presidente das Centrais Elétricas de Mato Grosso em Cuiabá.
Zk –
Qual o resultado desse encontro?
Zé
Luiz – Que bom te encontrar, disse ele, compramos a Centrais Elétricas e
precisamos de uma pessoa com o teu perfio, porque estamos levando muita pancada,
o povo não aceita a privatização e o governador Dante de Oliveira é uma pessoa
muito boa, essas coisas. Aceitei o convite, trabalhei durante toda a gestão do
Fernando Henrique. Na época foi
implantado o programa luz no campo, foi um trabalho muito interessante. Fiquei
nas Centrais Elétricas de Mato Grosso - Cemat, por sete anos.
Zk –
E Rondônia?
Zé
Luiz – Em janeiro 1976 vim a Rondônia realizar uma reportagem pra revista Veja,
no Distrito de Espigão D’Oeste, com os índios Suruís. Desembarquei no aeroporto
Caiari em Porto Velho fui pro hotel e depois fretei um táxi (fusquinha), saí
três horas da manhã embaixo de um temporal, no rumo de Espigão. O fusquinha não
andava, deslizava em cima do barro da BR 364, cheguei à aldeia aproximadamente
a meia noite e não tinha energia elétrica. Na realidade Espigão se resumia numa
praça cercada de galpões, muitos bares, prostitutas, muito índio e garimpeiros.
Fiquei três dias, produzi a matéria que deu uma página da revista Veja e a
matéria foi censurada pelos censores da ditadura militar. Guardo até hoje o
texto e a foto censurada. A FUNAI dizia que não podia prestar assistência aos
índios, mesmo tendo aeronaves e helicópteros e não tinha como descer nas
aldeias e eu de fusca cheguei. A Veja colocou a foto com um monte de índio
cercando o fusca, a legenda dizia, “Aonde a FUNAI não chega de helicóptero, o
repórter de Veja chega de fusca”. Não teve jeito, a censura cortou toda
a matéria. A partir daí passei a ler tudo sobre Rondônia fui pro campo da
pesquisa para saber, mas e mais sobre Rondônia.
Zk –
E surge o livro Genocídio
Zé
Luiz – Juntando toda essa papelada, há sete anos vim para Rondônia, fui
contratado como assessor de imprensa da Faculdade São Lucas pelo seu Jaime
Gazola e dona Maria Elisa gente muito boa, faço questão de destacar isso. Nesse
meio tempo, começou o movimento das obras das usinas do Madeira, muitas
contradições, muitas denunciais de crimes ambientais de desvio de dinheiro, por
aí afora. Isso foi despertando minha atenção, diante daquilo que já tinha sobre
a história de Rondônia, que veio de Rondon, Roquete Pinto, Getúlio Vargas,
Juscelino quer dizer, esse desenvolvimento com a abertura da BR 29 mais tarde
364 e pesquisando, pesquisando, resolvi fazer uma pesquisa no Baixo Madeira. A
ideia era escrever o livro: “Rondônia de Getúlio a Lula”. Por quê? Porque
Getúlio criou o Território e Lula estava complementando com as usinas do
Madeira.
Zk –
Por que trocou o nome par “Genocídio do Madeira”?
Zé
Luiz – Quando já tinha escrito umas cem páginas (terminou saindo com 266
páginas), vi que estava faltando alguma coisa, to contando a história recente
disso aqui a história dos últimos cem anos, mas, há 400 anos essa região já
existia, então desci o Madeira, foram 45 dias pesquisando no Rio Madeira, fui
até o entroncamento com o rio Amazonas e de lá pra cá retornei andando de
barco, rabeta, canoa até mesmo andando a pé e dormindo em barracos de
pecadores, pra conhecer a realidade e descobri na cidade de Borba (AM), muitos
documentos que mostram o que os europeus que chegaram aqui a partir de 1492 e
tentaram domesticar os índios e o que eles praticaram foi um verdadeiro
Genocídio com os índios que viviam ao longo do rio Madeira nos mil quilômetros
entre a fós até onde hoje é a cidade de Porto Velho. Aí o que era pra ser de
Getúlio a Lula passou a ser “Genocídio no Madeira”. Os europeus não só acabaram
com os índios, exterminaram com as tartarugas, os jacarés e tantas outras
espécies. Se você viajar pelo Madeira, vai ver que é um rio sem vida, com
exceção dos Botos o Madeira é praticamente um rio morto.
Zk –
Qual a editora e quanto custa o livro?
Zé
Luiz – É a Editora Protexto de Curitiba, o exemplar custa penas R$ 49,50.
Zk –
Hoje está fazendo o que?
Zé
Luiz – Com o apoio, quero resaltar isso, do Dr. Osmar Silva estou no
Departamento de Comunicação do Governo de Rondônia – Decom produzindo matérias
sobre o setor produtivo, assim como, me foi cedido um espaço e tenho um programa
na Rádio Globo Rondônia, também voltado para o setor produtivo, que vai ao ar
das 6 as 7 horas da manhã, de segunda a sábado.
Zk –
Contato?
Zé
Luiz – 9945-3620.
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