Quem é
atendido pelo médico urologista Victor Sadeck, não imagina que aquele Doutor que
passa as tardes em seu consultório montado no hospital 9 de julho em Porto Velho,
foi craque de futebol de salão. “Criamos o Atlético Clube Sadeck onde eu atuava
como goleiro e fomos campeão do primeiro campeonato organizado pela Federação
de Futebol de Rondônia”. Apesar de ser considerado “baixinho”, foi contratado
como jogador de basquete pelo Clube Olímpico de Manaus na posição de pivô. “O
Olímpico era quem pagava meus estudos”. Tem mais, Vitor Sadeck é carnavalesco
por excelência e foi o Mestre Sala da escola de samba Pobres do Caiari por
alguns anos. “Ganhei do Cabeleira três anos consecutivos. Até hoje ele não
engole essa derrota”. “Além disso, criou o bloco carnavalesco “Concentra, mas
não sai” que toda segunda feira de carnaval “Concentra” no bar do Pernambuco
com direito a orquestra, caldo de carneiro, muito confete e serpentina além de
bebida ‘moderada’.
São
muito interessantes as história que o Dr. Victor Sadeck tem para nos contar,
inclusive sobre caçada de bacurau no campo de aviação do aeroporto Caiari.
ENTREVISTA
Zk –
Vamos começar falando sobre a infância e adolescência?
Victor
Sadeck – Minha infância foi maravilhosa, no bairro Caiari, praça Aluízio
Ferreira, caçada, passarinhada, pegar vento no avião já que o aeroporto Caiari
era ali onde hoje é o Claudio Coutinho. Estudei em colégio como o Duque de
Caxias, Escola Normal, Barão do Solimões com as professoras queridas Marise
Castiel, Aurélia, Lígia Veiga e tantas outras, minha mãe professora Odaléia que
fazia parte disso tudo. Foi uma infância maravilhosa com muito esporte.
Zk –
Você participava das caçadas de bacurau. Como vocês capturavam os pássaros?
Victor
Sadeck – Bacurau é uma ave de hábitos noturnos e ela fica encadeada com a luz
da lanterna. Então era assim, um seguia com a lanterna e o outro com uma vara,
isso no campo de aviação, quando a gente localizava o bacurau dirigia o foco da
lanterna para seus olhos e metia a “vara’”, pou! Depois a turma de caçadores se
encontrava geralmente na praça Aluízio Ferreira depenava os bichos e alguém se
escalava para preparar a Canja de Bacurau que era e é muito gostosa.
Zk – A
que você atribui tantos pilotos de aviação que residiam no bairro Caiari como o
Cláudio Pintada, Pedro Otino, Leno Compasso Duarte e seu irmão Fred?
Victor
Sadeck – O Fred meu irmão se formou piloto em virtude de morarmos na cabeceira
da pista de pouso do aeroporto Caiari assim como os demais que você citou.
Quando os aviões iam decolar, partiam ali de perto da rua Pinheiro Machado
justamente aonde hoje é o Complexo Deroche e o Cláudio Coutinho e a gente
corria para pegar vento. Essa turma que você citou não ficou apenas no “pegar’
vento, foi fazer Aeroclube e se transtornou em piloto de avião comercial, uns
de helicóptero e até de jatinho como é o caso do Fred Sadeck.
Zk –
Você fez o científico (ensino médio hoje), aqui em Porto Velho?
Victor
Sadeck – Aconteceu um caso interessante. Quando acabamos o ginásio, na época
não tinha como o governo pagar os professores para lecionar o científico, então
aconteceu uma reunião entre Abnael Macha, Lourival Chagas, Marise Castiel, Dr. Otino
de Freitas, Orlando Freire entre outros, que resolveram ministrar aula de graça
para os alunos do científico, preparação para o vestibular. Eu fiz o primeiro e
o segundo ano aqui e o terceiro em Manaus e Belém.
Zk –
Você fez faculdade em qual cidade?
Victor
Sadeck – Fiz vestibular para medicina e passei na Universidade do Pará. Me
formei em Belém. Veja que sempre estudei em escola pública.
Zk – Residência?
Victor
Sadeck – Sai de Belém direto pro Rio de Janeiro onde fiz residência na
Universidade Federal Fluminense em Urologia muito boa e aqui estamos.
Zk – O
governo do Território de Rondônia mantinha uma residência em Belém chamada
“Casa do Estudante”. Você morou nessa casa?
Victor
Sadeck – Isso foi uma das coisas boas que conseguimos, a Casa do Estudante
ficava na rua Domingos Marreiros e na minha época moravam lá: Viriato Moura,
Floriano Riva (já falecido), José Hiram, Noé, Airton, Aníbal e Gilberto
Cavalcante, Brasil, Calmon, Vitor Villar, João Wilson.
Zk –
Como era a convivência na Casa, tinha alguém de Guajará Mirim?
Victor
Sadeck – Tinha um de Guajará que era o Nelson Casara que a gente chamava de
“careca”. A convivência era das melhores possíveis, era uma família, um ajudava
o outro era maravilhoso. Talvez um dos tempos mais feliz da minha vida foi
nessa época.
Zk – E
como foi que você passou a integrar a escola de samba Pobres do Caiari?
Victor
Sadeck – Isso aconteceu bem antes da faculdade de medicina. Acho que foi em
1966 já era o segundo ano da escola. Acontece que a escolinha como a gente
chamava, começou em 1964 com aquele bloco de sujo, daí o nome “Pobres”. Essa
escola tem uma figura ímpar que é o José Roberto de Melo e Silva o Zeca. Ele
foi o principal criador da escola, juntou-se a ele o Chico Sadeck, José Carlos
Lobo, Celso Otino, Hosana, João Ramiro e tantos outros. O certo foi que no
segundo ano eu já estava lá.
Zk –
Fala mais sobre essa época?
Victor
Sadeck – Era muito bacana, o Caiari até hoje é uma bairro que vive festa,
carnavalesco, é múltiplo em atividade. Quando comecei a desfilar pela escola,
meu instrumento preferido era o tamborim.
Zk –
Lembro que muito antes da criação da escola de samba, vocês desfilavam pelas
ruas do bairro e do centro da cidade, tocando samba. Quem participava?
Victor
Sadeck – É isso mesmo, a gente se reunia geralmente lá no canto de casa na
esquina da Duque de Caxias com a Santos Dumont e dali partíamos com a batucada
pelas ruas do bairro e depois descíamos a Presidente Dutra no rumo da praça
Rondon. Era o que chamavam de bloco de sujo. Todo domingo depois do ano novo a
gente saia brincando carnaval e até frequentávamos as “Batalhas de Confete”
promovidas pela prefeitura. Bem antes disso existiam os clubes carnavalescos.
Zk –
Você brincou carnaval no bloco de algum clube?
Victor
Sadeck – Brinquei. O Bancrévea era vermelho e branco já no Ypiranga não sei explicar
porque a gente usava camisa verde quando as cores do clube era azul e branco.
Era assim, antes mesmo da festa começar pra valer o bloco entrava, para animar
os foliões sócios.
Zk – E
a história do Vitinho Mestre Sala da Pobres do Caiari?
Victor
Sadeck – O primeiro Mestre Sala da Pobres do Caiari foi o Celso Otino conhecido
como Mel. Lembro que na primeira vez que ele desfilou o sapato era tão grande
que ele saiu arrastando pelo chão enquanto balançava o leque, era uma graça. No
ano seguinte o Celso não apareceu e eu como fazia umas presepadas dançando, o
Zé Roberto chegou e disse: Tu vai ser o Mestre Sala! Ai fui aprendendo, na
época já tinha começado a viajar, assisti uma vez o desfile no Rio de Janeiro
então comecei a procurar imitar os passos e pronto.
Zk – É
verdade que o Cabeleira nunca ganhou de você na avenida?
Victor
Sadeck – (sorrindo) Devo dizer que o Cabeleira foi um dos maiores dançarinos,
passista que já vi, eu o admiro até hoje. Mas eu cheguei inovando, havia visto
o grande Delegado dançando, vi também outro Mestre Sala que dançava com um
espadim e saltava, fazia malabarismo, era um show e eu peguei bem os saltos que
ele fazia. Até a dona Marise entrar para a escola a gente só levava porrada,
pois a Neire Azevedo era madrinha da Diplomatas e tinha muita influencia
inclusive junto ao governador e em conseqüência dessa amizade a Caiari só
apanhava. Nessa época também devemos a organização do carnaval ao Odacir Soares
ele quando foi prefeito, colocou “banca” julgadora, as escolas recebiam notas
de uma equipe de jurados convidados do prefeito. O Odacir foi quem começou
realmente a organizar o carnaval de rua de Porto Velho. Quando começamos a
disputar com a Diplomatas de igual para igual ganhei três vezes seguidas do
Cabeleira. Mas continuamos amigos, tanto que quando desfilei na escola de samba
Salgueiro do Rio de Janeiro trouxe a fantasia e dei pro meu amigo Cabeleira.
Zk – O
que você lembra dos desfiles dos blocos de Bancrévea e Ypiranga?
Victor
Sadeck – A disputa entre os passistas era muito acirrada. O Júlio Cesar -
Chapulita e a Neguinha eram grandes passistas, nas batalhas de confete era que
o bicho pegava entre os passistas dos blocos que dançavam frevo. As Batalhas de
Confete eram muito concorridas, lembro do Rei Momo Emil Gorayeb que tinha na
corte o Lima Verde, Beni, Reginaldo Mendes e outros. A corte desfilava pela
Presidente Dutra em carro aberto seguido pelos blocos e depois as escolas de
samba. Era uma época que a cidade esperava o carnaval e o são João para se
divertir.
Zk – É
verdade que você foi goleiro de futebol de salão?
Victor
Sadeck – É! Criamos um time de futebol de salão: o Atlético Clube Sadeck eram
os irmãos Sadeck com um primo e o Valter Santos que era o único de fora. Era
Eu, Fernando, o Chico, Luiz Guilherme (primo) e o Valter Santos. Depois entrou
o Serrão. O campeonato era disputada nas quadras da 3ª Cia de Fronteira e na do
Bancrévea. Os times eram: Sampaio, 5 Azes que tinha o Zé Artur e o Cleveland
grandes jogadores, tinha o Acariquara com o Ivo do Pedrinho um senhor craque de
salão. Foi o primeiro campeonato de Futebol de Salão pela Federação e nós fomos
os campeões.
Zk – E
o lance do goleiro?
Victor
Sadeck – As coisas foram acontecendo. Nunca fui bom de chutar bola e como tinha
um bom reflexo optei por jogar na posição de goleiro e deu certo. A mesma coisa
foi no basquete. Saí daqui pra estudar jogando basquete. Joguei no Olímpico de
Manaus que começou a bancar meus estudos, eu era baixinho, mas, arremessava bem
da zona morta. Por aqui passaram grandes jogadores de basquete como Sapucaí,
Adilson, Wladimir Carvalho, Kida, essa turma me ensinou a jogar basquete. Os
jogos aconteciam na quadra do Barão do Solimões. Nas férias a gente ia de trem
jogar em Guajará Mirim eram as chamadas “embaixada” estudantil, bom mesmo era o
pernoite em Abunã. Era uma farra, são lembranças maravilhosas.
Zk – E
as namoradas?
Victor
Sadeck – Naquela época era bom, nós éramos puros, a gente fazia serenata pras
meninas, tudo passou, fui embora conheci a Márcia no Rio de Janeiro casei
tivemos três filhas maravilhosas. Hoje já tenho dois netos e o terceiro está
chegando.
Zk –
Vamos voltar à escola de samba Pobres do Caiari e as noitadas bordando
fantasia. Como era?
Victor
Sadeck – Em época pré-carnavalesca o bairro não dormia, as equipes se dividiam
entre a casa da dona Florípedes de Carvalho, dona Vitória, Ilda Maia, dona
Brandão, Augustinha, dona Maria tia do Viriato. Uns pregando lantejoulas,
outros canutilhos era tudo bordado à mão. Tinha um detalhes ninguém recebia
ajuda de governo não, era na base da cota, da cooperação entre os simpatizantes
da escola.
Zk –
Além da escola de samba?
Victor
Sadeck – Tinha a quadrilha do Zé Piapó que era o Zeca Melo, mas, eu gostava
mesmo era de brincar no Boi Bumbá do Duque de Caxias. A dança da quadrilha era
diferente, os passos eram mais cadenciados. Hoje a turma não dança quadrilha,
pula frevo, é bonito não resta dúvida, mas as do meu tempo era melhor.
Zk –
Hoje você brinca carnaval em algum bloco?
Victor
Sadeck – Sempre gostei de carnaval, já não desfilo em nenhuma agremiação
carnavalescas, mas criei junto com os amigos o bloco; “Concentra, mas, não sai” lá no bar do Pernambuco e ali as segundas
feiras de carnaval a gente reúne a turma, tem orquestra aparelhagem de som,
muita marchinha tradicional, mas, não saí.
Zk –
Vamos falar sobres seus pais?
Victor
Sadeck – Meu pai chegou aqui na década de trinta vendendo botão. Minha mãe
ficou órfã e foi entregue as irmãs do colégio Gentil Bittencourt ela se formou
professora normalista e veio pra cá pra Porto Velho e conheceu o papai numa
festa de carnaval no clube Internacional, o resultado é que estamos aqui
contando a história. Somos Fernando, Frederico, Francisco, e Eu tem ainda duas
irmãs, a Aracélia que faleceu no ano passado e a Leinha esposa do Odacir.
Zk –
Você foi candidato a prefeito de Porto Velho. Fala sobre essa investida na
política partidária?
Victor
Sadeck – Primeiro fui suplente de Senador e cheguei a disputar a prefeitura de
Porto Velho a pedido do Chiquilito. À época tinha feito um grande trabalho na
secretaria de saúde quando conseguimos barrar a entrada da cólera em Rondônia.
Reativamos o hospital do Cemetron, os primeiros pacientes com cólera vieram de
Humaitá (AM) e tratamos todos. Não houve nenhum óbito por causa de cólera aqui
e esse trabalho alcançou repercussão nacional, daí o Chiquilito me convidou
para sair candidato a prefeito e eu aceitei. Três prefeitos trabalharam na minha
campanha, Sebastião Valadares, Chiquilito e o Luiz Gonzaga. Acabei perdendo pro
Guedes.
Zk – A
que você atribui a derrota para o José Guedes?
Victor
Sadeck – Eu era muito novo, não tinha experiência política, o Guedes apoiado
pela PT e eu pelo Odacir que estava empenhado em defender o presidente Fernando
Collor de Melo que estava sendo cassado, quer dizer, minha candidatura foi
muito tumultuada. A experiência foi boa, mas, não voltaria mais a me
candidatar. O estado de Rondônia deu muito azar.
Zk –
Por quê?
Victor
Sadeck – Não conseguimos, depois do Jorge Teixeira um administrador sério.
Tivemos muitos políticos de expressão nacional como Jerônimo Santana, Odacir
Soares, esses caras eram preparados e representaram muito bem nosso estado,
depois o estado passou a ser usado para enriquecimento de verdadeiras
quadrilhas, a Assembléia sempre com problemas. São grupos e pessoas mal
intencionadas que se elegem já com esse intuito de dilapidar o estado, isso me
afastou muito da política.
Zk – O
Rondoniense nato, se recente da falta de líderes políticos aqui nascidos ou
criados. Você concorda?
Victor
Sadeck – Claro, em gênero número e grau. O Chiquilito foi o nosso último grande
líder, esperávamos muito do Piana, mas, não deu. Ele ainda chegou a fazer um
bom trabalho, mas, não houve continuidade. Nós pagamos também esse preço, em
virtude da migração que foi muito grande. O Teixeira abriu as portas, ganhava
terra quem derrubasse mais. Nós perdemos a identidade. Pioneiros foram nosso
antepassados. Jacob Athalla era outra grande expressão.
Zk –
Para encerrar! Fala de quando vocês chegavam de férias?
Victor
Sadeck – Já chegava com o mais novo LP do Roberto Calos debaixo do braço,
alguém organizava as festinhas, onde a gente ia paquerar. Chegava o carnaval era
a grande disputa entre Diplomatas e Caiari. Lembro que uma vez tivemos que
trocar as bandeiras das escolas na tentativa de acabar com a disputa violenta
que estava tomando conta das apresentações. Temos aqui um grupo de compositores
de samba enredo maravilhoso, você, Bainha, Ernesto Melo que não ficam a dever
nada a nenhum compositor das grandes escolas do Rio de Janeiro
Zk –
Você nasceu em Porto Velho?
Victor
Sadeck – Minha mãe teve um problema na gravidez na hora do meu nascimento e
teve que ser levada as pressas para Manaus onde nasci, me registraram como
amazonense não sei por que, pois com sete dias de nascido, me colocaram num
avião Catalina da Panair do Brasil e eu vim embora pra cá, a Catalina aquatizou
no Porto da Rádio Farol. Me considero portovelhense da gema. Fui feito e me
criei em Porto Velho. Só lamento não ver uma rua com o nome dos meus pais,
Odaléia Sadeck e Vitor Sadeck tinha uma com o nome do papai lá no Ulisses
Guimarães e não sei por que cargas d’água mudaram o nome.
Zk – E
aposentadoria?
Victor
Sadeck – Médico não se aposenta. Vou clinicar se Deus quiser até o fim da minha
vida. Atendo toda tarde no hospital 9 de julho e uma vez ou outro vou fazer uma
cirurgia no Hospital de Base. Independente de ser médico, vou brincar carnaval
na Banda do Vai Quem Quer e depois no bloco “Concentra, mas, não sai”, segunda
feira de carnaval, lá no bar do Pernambuco junto com o Emilzinho!
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