Histórias
do Abidon Maravilha
Quem vê o cidadão Abidon
Ferreira da Silva o popular Abidon Maravilha, jamais poderia pensar que o
“Maravilha” do seu nome, no inicio, era um apelido pejorativo. “Acontece que
fui um menino muito traquino e por isso, minha mãe me mandou para a Maravilha
que era uma espécie de “prisão” que ficava do outro lado do Rio Madeira”. Ao
entender que a vida de moleque travesso não o levaria a nada, Abidon passou a
se dedicar a música transformando-se num dos cantores preferidos do programa
“Osmar Vilhena Show”, que era apresentado todos os domingos na rádio Caiari. Em
virtude de um acidente quando servia o Exército foi pra Reserva como Sargento e
desde então, passou a se dedicar ao trabalho comunitário, principalmente no
bairro Tancredo Neves onde criou a Associação do Bairro e já foi eleito três
vezes presidente, além de fazer seus sucessores. “Isso começou no programa do
Osmar, pois doava o cachê para os meninos do Belizário Pena”. Hoje além do
trabalho comunitário Abidon continua cantando suas canções; “Não faço mais
shows, porém quando dá vontade vou cantar lá no Paulinho do Posto São Paulo e
na Seresta do Mercado Cultural”. É esse cidadão humilde que chegou a bater
tambor no Batuque de Santa Bárbara que vamos conhecer melhor, através da
entrevista que segue.
ENTREVISTA
Zk – Vamos falar da sua
infância?
Abidon – Nasci aqui mesmo em
Porto Velho há 67 anos. Meu pai Antônio Belarmino que morreu quando eu ainda
era muito criança, foi carroceiro e minha mãe doméstica. Minha infância e adolescência
foi vivida no bairro do Mocambo.
Zk – Qual a brincadeira da
meninada do Mocambo naquela época?
Abidon – Tinha aquelas
brigas entre os bairros e no Mocambo o xerife era eu.
Zk – Como eram as batalhas?
Abidon – Era na porrada
mesmo, porém sem utilizar arma branca ou de fogo, era na base do mangará de
banana e baladeira. Geralmente a gente atraia os adversários que na maioria das
vezes, era a rapaziada do bairro Caiari, para dentro do cemitério dos
Inocentes, naquele tempo o cemitério era cercado apenas com arame farpado. De
noite eles chegavam e entravam pelo portão da Almirante Barroso e a gente
ficava esperando dentro das covas, outra turma assim que eles entravam no
cemitério, fechava o portão da Almirante e aí o cacete comia.
Zk – Quais os moradores do
Mocambo naquela época?
Abidon – Tinha o velho Zé,
Joana Marreteira, André, dona Guiomar mãe da Vanda e da Araci, Francinete, Antônio
do Violão entre outros.
Zk – É verdade que você é
parente da Mãe Esperança Rita a fundadora do Batuque de Santa Bárbara?
Abidon – Na realidade a Mãe
Esperança criou minha irmã Amália e outro irmão meu o Clóvis inclusive levou os
dois pra Belém. Quando o Batuque foi pro KM-1 hoje bairro Santa Bárbara minha
mãe foi também, aliás, minha mãe fazia parte do Batuque. Apesar de não gostar
muito daquilo, ainda cheguei a bater muito tambor no Santa Bárbara, bebia o
chamado “mocororó” que aquela bebida servida na cuia. O negócio ali era meio
brabo, tinha que respeitar.
Zk – Por que Abidon
Maravilha?
Abidon – Muita gente pensa
que o apelido tem a ver com aquele jogador de futebol Fio Maravilha. Não é não!
Acontece que devido eu só viver brigando fui parar na “Maravilha”.
Zk – E o que era “Maravilha”?
Abidon – Maravilha era uma
espécie prisão para crianças e adolescentes, que funcionava do outro lado do
Rio Madeira, ali perto do porto da balsa pelo lado direito. Ali a gente
trabalhava plantando verdura e outros produtos agrícolas, além de receber as
devidas “correções”. Quando a criança era muito traquina, os pais costumavam
ameaça-las dizendo: “Menino te ajeita se não te mando pra Maravilha”. Depois
transferiram esse centro de correição para a BR-29 hoje BR 364 no quilometro 25
e ficou conhecido como “Pamos”, que por muito tempo foi administrado pelo
saudoso Walter Bártolo.
Zk – E por que você foi
parar na Maravilha?
Abidon – Pra falar a
verdade, fui um menino muito traquino, vivia batendo nos outros, aprontando
mesmo. Para fugir da polícia dormia fora de casa. Um dia sai de casa, mas minha
mãe já tinha armado a arapuca, quando a polícia chegou pra me pegar, eu tinha
14 anos na época e então virei o cão. Era tão danado que até anzol usaram pra
me pegar. As vezes me socava dentro da lama vestido num calção azul e a polícia
passava e não me via. “Rapaz esse moleque entrou aqui, eu vi e cadê ele”, e eu
dentro da lama.
Zk – Você estudou em quais
colégios?
Abidon – Na Samaritana,
Mutilo Braga e no colégio Rio Branco. Em virtude de um acidente os médicos
recomendaram que eu parasse de estudar, porque ficava muito nervoso e em
consequência agressivo.
Zk – E você continuou
trabalhando em que?
Abidon – Fui servir o
exército, mas sempre com esse problema de nervosismo e depois de alguns anos
fui pra reserva como Sargento.
Zk – E o Abidon cantor
surgiu quando?
Abidon – Lá no Mocambo
aprendi a tocar pandeiro com um rapaz chamado Negrante depois na casa do seu
Antônio do Violão sempre se reunia uma turma tocando violão, cavaquinho e entre
os frequentadores tinha o Capote um violonista dos melhores, eu ficava ali
prestando atenção nota por nota. Quando ele dava uma folguinha quando saia pra
ir ao banheiro eu pegava o violão ficava treinando. Minha escola de música foi
ali. Então comei a cantar e me acompanhar ao violão.
Zk – E a composição musical?
Abidon – Depois que aprendi
a tocar violão me arrisquei a fazer música e criei minha primeira canção que
foi “Procuro
em Minha Mente” cuja letra diz: Procuro em minha mente/E não posso
entender/Se alguém me ama de verdade/Como é que vou saber/Com isso não estou
contente/Será que vou morrer inocente/Se isso eu não perceber...!”. Depois
vieram outras músicas e os amigos começaram a me procurar para gravar as
músicas deles, porque achavam que eu tinha voz boa.
Zk – Você chegou a cantar
nos programas de auditória da época?
Abidon – Me apresentava no
programa Osmar Vilhena Show como atração e não como calouro. Meu cachê eu doava
todo para a entidade Belizário Pena. Eu
dizia no ar (o programa era transmitido pela rádio Caiari), esses 250
Cruzeiros, mando pras crianças do Belizário Pena.
Zk – Você chegou a gravar
disco?
Abidon – Apesar do sucesso
que fazia, não consegui gravar meu disco naquela época. O Osmar era o
representante da CBS em Porto Velho e tentou convencer os diretores da
gravadora a gravar comigo, mas, foi em vão. Mas no programa de auditório dele
eu era bem considerado.
Zk – Naquele tempo quais os
cantores que se apresentavam no Osmar Vilhena Show como atração?
Abidon – Tinha o S. Silva,
Sancler, Jorge Andrade, Ana Amélia, Joaçaba e o Joel Silva entre outros. Além
do programa do Osmar a gente cantava nas chamadas “Rádio Cipó” que naquele
tempo o alto falante era chamado de “Corneta”, era eu e o S. Silva. Depois
passei pro futebol.
Zk – Em qual time?
Abidon – Joguei no Esporte
Clube Rondônia e depois fui para o Botafogo. Jogava de centro avante com o
Eliezer. Fiquei um tempo em Guajará Mirim jogando pelo Pérola, Joguei na
Bolívia como profissional. Joguei no Botafogo quando o time era respeitado,
quando tinha o Rubinho e outros craques com Raimundão, Geraldão, Honorato e o
Sabará.
Zk – Como cantor, você
chegou a se apresentar fora de Porto Velho?
Abidon – A TV Rondônia
quando inaugurou a TV Guajará nos levou para a inauguração e o resultado disso,
foi que os bolivianos gostaram e terminei fazendo uma excursão por várias
cidade bolivianas, chegando inclusive a Riberalta. O sucesso era: Numa tarde
linda/Eu me lembro ainda/Do velho Cais Dourado...
Zk – Você me falou que tem
umas músicas novas sobre a nossa história. Quais são?
Abidon – É verdade, o
compositor Luizito me procurou solicitando que eu gravasse uma música dele:
Este ano eu vou/Este ano eu vou/Mergulhar no Rio Madeira/Tirar ouro sim
senhor/Primeiro vou ao Machado, Prainha e Ribeirão/Embaúba, Tamborete,
Periquito, Ribeirão/Quando vier voltando passo no Caldeirão//... Quando o Rio
encher/Bamburrado eu ei de estar/Aí venho para a cidade/Uma casa vou
comprar/Presente pra minha nega/E um carro pra passear...
Zk – Outra?
Abidon – Tenho saudade do
trem do Guaporé/Trem que levou eu e a minha mulher/Tenho saudade do trem do
Guaporé/Que viajava na Madeira Mamoré/Tenho saudade do tempo que o trem
corria/Levava a gente e trazia pra lá e pra cá/Queimando lenha e no trilho
jogando brasa/Levando de casa em casa a alegria de chegar/O trem subia/O trem
baixava/O trem corria/Mas, se atrasava/O trem caia/Nos levantava/Com dois
dias/Ele chegava... Essa música é do Antônio Carneiro.
Zk – Hoje quem quiser fazer
um show com a tua participação faz o que?
Abidon – Não estou mais
fazendo show, canto de vez em quando em encontros com os amigos, canto as vezes
lá no Paulinho do Posto São Paulo. Agora meu trabalho é mais social.
Zk – Pois é, fala desse
trabalho comunitário?
Abidon – Trabalho junto à
Associação do Bairro Tancredo Neves desde 1992, ajudando no que as pessoas
precisam. Tive três mandatos diretos e já coloquei outros presidentes. Isso
porque as pessoas confiam na gente. Já fui candidato a vereador bem votado.
Zk – Para encerrar?
Abidon – Que nossa juventude
procure viver sempre em harmonia com a educação. Fui um moleque travesso e não
aconselho ninguém fazer o que fiz. Graças a Deus me transformei nessa pessoa
que preza pelo bem estar do próximo. Violência não dá camisa a ninguém.
Obrigado!
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